RÁDIO UNIVERSITÁRIA DE AVEIRO

Opinião

"O dia “D”, de democracia", opinião de Miguel Pedro Araújo

Miguel Pedro Araújo, é natural de Aveiro. Licenciado em Comunicação e Assessoria de Imprensa, com Pós-graduação em Direito da Comunicação. Atualmente, frequenta o Mestrado em Políticas Públicas, percurso Governação Local e Regional, na UA. Depois de uma passagem pela rádio (em Aveiro e na região), profissionalmente esteve sempre ligado à comunicação autárquica, nos Municípios de Aveiro e de Ílhavo. Tem na política e nos direitos humanos o principal foco do seu ativismo.

"O dia “D”, de democracia", opinião de Miguel Pedro Araújo
Miguel Pedro Araújo

Miguel Pedro Araújo

Opinião
12 mar 2025, 08:47

A dinâmica da democracia tem esta nobre essência: devolver ao povo a legítima e soberana de escolherem o destino do país. As crises políticas fazem parte da vivência democrática de um Estado de Direito.

Neste contexto, não são os cidadãos que têm ou devem ter medo de exercer o seu direito político e o seu dever cívico.

O uso da narrativa do “ninguém quer eleições” é falaciosa e demagoga. Esta apropriação da vontade coletiva é abusiva e inconsistente. Quem sempre pareceu ter receio de um processo eleitoral, paradoxalmente, foi o Governo e o PSD (que foram quem colocou o cenário para ponderação da Assembleia da República) ou aqueles que se deparam com o risco factual e real de perderem o seu lugar parlamentar ou governativo.

O país não parará por três meses, as empresas não deixarão de produzir, os serviços, de uma forma, eventualmente, mais lenta, não deixarão de prosseguir as suas funções. O mundo não mudará o seu ciclo (neste momento, infelizmente, de pernas para o ar) por causa das eleições em Portugal. Basta recordar que a Alemanha, em plena crise geopolítica global, ainda há pouco mais de duas semanas teve um processo eleitoral (também fruto de uma crise política interna), sem qualquer tipo de constrangimento.

Não haverá paralisia funcional do país só porque há eleições… Pode, de facto, haver alguns atrasos, que podem impactar, por exemplo, com o PRR ou outras temáticas deliberativas (por exemplo, a revisão do RJIES… embora, neste caso, até possa ser uma boa notícia).

Portanto, o país vai para eleições porque a democracia assim o determina, a ética política assim o exige, a transparência a isso o obriga.

Aqui chegados, temos que ser claros. Os únicos responsáveis pela crise política e pela queda do Governo são Luís Montenegro e o PSD.

Acho que não vale a pena trazer para aqui a “fita do tempo” sobre o que trouxe o estado de alma da política nacional até ao dia de hoje: o primeiro-ministro teve todas as oportunidades, primeiro de forma proativa, depois por pressão da oposição para esclarecer e limpar todo o contexto que poderia levantar e levantou suspeitas do não cumprimento da exclusividade a que está obrigada a sua função; para clarificar dúvidas sobre transparência e imparcialidade; sobre eventual e alegado incumprimento fiscal e ético. Não é inócuo o que a Entidade da Transparência já afirmou, o que alguns constitucionalistas já proferiram ou a ação que a Procuradoria-geral da República já está a desenvolver (após denúncia) e que, há pouco mais de um ano, foi motivo semelhante para a “emissão de um parágrafo palaciano”.

Ora, a apresentação, por parte do Governo, da moção de confiança que foi chumbada foi, para além de um enorme tiro no pé, querer condicionar a democracia e querer limitar a Assembleia da República. Não vale a pena o esforço inglório do PSD querer sacudir a água do capote, passar a terceiros a responsabilidade que só a eles lhe cabe. O cenário era por demais conhecido, pelo menos há um ano. Face ao quadro parlamentar vigente, qualquer moção de confiança era, à partida, um processo morto à nascença. O Partido Socialista sempre o deixou bem claro: não passariam moções de censura, como nunca viabilizaria uma moção de confiança.

O que se assistiu hoje [ontem], na Assembleia da República, foi um mau exercício da nobre função política e uma afronta à democracia. Usar um mecanismo parlamentar para esconder as responsabilidades de transparência e de ética (pelo menos) do primeiro-ministro, revertendo a temática em causa e em debate (a moção) em subterfúgios políticos (querendo discutir o que não estava em discussão: a Comissão Parlamentar de Inquérito; ainda por cima invertendo todas as regras, competências, funcionamentos e procedimentos regimentais e legais), criando, com isso, uma crise política e a queda do Governo, é um ato político que cabe, única e exclusivamente, ao Governo. Toda a oposição (com a exceção demonstrada pela IL e pelo CDS) foi apenas coerente com as suas posições.

Aliás, o PSD e o Governo usarem o PS como bandeira da irresponsabilidade é um deplorável ato de baixa política e de desespero partidário. O PS, até à data, por exemplo, viabilizando o Orçamento do Estado, deu todas as condições para o Governo e o PSD governarem. Num momento de fragilidade política, o primeiro-ministro preferiu criar uma crise política e escamotear as suas responsabilidades, e, claramente, autodemitiu-se, a si e ao seu Governo.

Mais do que o povo ter medo de eleições (que não tem), o que o povo receia, mesmo, é a deterioração da democracia e do Estado de Direito, e o que o povo não quer, garantidamente, é voltar a assistir ao ignóbil circo que hoje se assistiu na Assembleia da República, como joguinhos estratégicos, com manobras e truques que só tinham como objetivo condicionar a democracia e enganar os portugueses.

Posto isto, o futuro estará, democraticamente, nas mãos dos portugueses. Não vale a pena estarmos a tecer cenários, mesmo com o que as últimas sondagens revelam. No dia 11 ou 18 de maio logo saberemos a superior decisão democrática dos portugueses e o povo sempre soube - e sempre saberá escolher - livre e legitimamente.

"Uma derrota do PSD, a nível nacional, fragilizará, ainda mais, a candidatura de Luís Souto à presidência da Câmara Municipal de Aveiro"

Mas voltemos aos impactos das eleições no país. Há, apesar do que acima referi, uma influência direta das eleições: até maio, infelizmente, as eleições autárquicas serão secundarizadas e relegadas para um plano, mediático e partidário, inferior. Com outro contexto: os resultados eleitorais (independentemente do cenário que daí surgir) terão impacto nas narrativas e propagandas no decurso da campanha autárquica e, possivelmente, em alguns resultados locais.

No caso de Aveiro, confirmadas as candidaturas já anunciadas pela Comissão Política Distrital, nomeadamente a do PSD Aveiro, não é expetável que, a poucos meses do processo eleitoral de setembro/outubro deste ano, haja alterações, porque se afigurariam processos debilitados.

No entanto, face ao que foi o processo de escolha do candidato do PSD Aveiro, face aos impactos que teve na estrutura concelhia local, face ao que foram já as recentes declarações públicas do ex-presidente da Mesa da Assembleia/Plenário de Militantes do PSD Aveiro [Ribau Esteves], uma derrota do PSD, a nível nacional, fragilizará, ainda mais, a candidatura de Luís Souto à presidência da Câmara Municipal de Aveiro. É importante não esquecer que esta candidatura foi uma opção polémica de Luís Montenegro e da Comissão política Nacional do PSD. Esse resultado terá um impacto direto na aposta, não consensual e destabilizadora, do PSD à presidência da autarquia aveirense, mais, até, do que uma vitória do PS no desenrolar da campanha de Alberto Souto.

A verdade é que, seja qual for o contexto, o processo e os resultados, será sempre a democracia a funcionar e a vontade do povo, legitimamente, a ditar os destinos do país e dos municípios. Sem medos…

Recomendações

"Conselho Geral: Supervisão, Independência e Participação", opinião de Diogo Gomes
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"Conselho Geral: Supervisão, Independência e Participação", opinião de Diogo Gomes

No passado dia 19 de Abril, publicou a Radio Ria um artigo sobre as eleições para o Conselho Geral da Universidade de Aveiro, que se realizam no próximo dia 3 de Junho. O artigo aponta também a armadilha do que são atualmente os conselhos gerais na generalidade das Instituições de Ensino Superior (IES): um colégio eleitoral para eleição do reitor. Importa recordar outras competências deste órgão. De acordo com o regulamento jurídico das IES (RJIES), ao Conselho Geral compete a definição das linhas estratégicas através da aprovação dos planos estratégicos e de atividades, garantir a sustentabilidade financeira ao aprovar o orçamento e as contas, decidir sobre a estrutura interna e supervisionar o funcionamento da instituição ao acompanhar e fiscalizar a atividade do reitor e do conselho de gestão. Cientes do problema, os vários partidos têm vindo a trabalhar projetos lei na Assembleia da República, tendo na última legislatura sido apresentados projetos tanto do PSD/CDS (Governo) como do PS. Nestes projetos, o Conselho Geral é desligado da eleição do reitor, que passa a ser feito através de uma eleição direta pelos professores, investigadores, funcionários, estudantes e até alumni. A eleição direta do reitor tem duas grandes vantagens. A primeira - e a mais fácil de entender - é o poder que dá à comunidade universitária, de diretamente votar o candidato a reitor com base nos programas de ação do/a(s) candidato/a(s) admitido/a(s) e não nos manifestos apresentados por listas ao Conselho Geral que elencam um role de propostas e promessas executivas que não podem ser cumpridas por este órgão. A segunda grande vantagem é que liberta os representantes no Conselho Geral de qualquer compromisso de lealdade a um futuro reitor, permitindo desta forma que cumpram o papel de supervisão sobre aqueles que são os atos do reitor, com plena independência e transparência. Infelizmente a revisão do RJIES caiu com a queda do Governo a 12 de março, não se antevendo, num futuro próximo, a aprovação desta importante alteração à lei. Daí se conclui que, a breve trecho, a eleição do futuro reitor da Universidade de Aveiro, em 2026, tal como das demais IES, será feita nos trâmites habituais, com os candidatos a reitor a dinamizar ativamente a construção de listas, para garantir que no futuro os membros eleitos lhes sejam leais garantindo a posterior eleição e um mandato sem grandes percalços. O que está aqui em causa é o que os anglo-saxónicos chamam de “checks and balances”, cujo funcionamento hoje temerariamente testemunhamos no outro lado do atlântico. Para o Conselho Geral cumprir a sua missão, este necessita de ser totalmente independente do(s)candidato(s) a reitor, pelo que as listas ao Conselho Geral precisam evidentemente de partir de membros da comunidade académica, despojados de qualquer compromisso com pretensos candidatos futuros ao cargo. Importa, por isso, eleger representantes que espelhem as opiniões e aspirações dos seus pares e a pluralidade da comunidade académica. Representantes que defendam os supra interesses da instituição, tendo tanto a capacidade de apoiar o reitor na prossecução dos planos e projetos que sejam do interesse da instituição e valorizar o que está a ser bem executado, assim como alertar, chamar à razão, questionar e/ou aconselhar sobre a boa gestão e planeamento da universidade, a curto, médio e longo-prazo. Para que esta não seja uma opinião inconsequente, juntamente com diversos colegas que partilham esta visão constituímos em tempo recorde o movimento “ua50 – 50 anos de história, 50 anos de ambição”. Do movimento saem 4 listas às circunscrições dos professores e investigadores. Com estas listas quisemos provar que não há inevitabilidades e que a UA está viva. Estamos a concorrer ao Conselho Geral com um manifesto claro de independência, sem qualquer apoio a putativos candidatos. A discussão de quem deverá ser o próximo reitor deve ser feita daqui a um ano, em sede própria, isto é, no Conselho Geral da UA que vier a ser eleito.

"Uma Nova Visão de Coesão para Portugal", opinião de André Gomes
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"Uma Nova Visão de Coesão para Portugal", opinião de André Gomes

Neste tempo em que a fruta da época são as promessas dos vários líderes políticos, nas suas já tradicionais proclamações por “amanhãs que cantam”, não podia deixar de apresentar uma proposta que estou convencido de que poderia vir a ser um importante contributo para resolver, por um lado, um grande problema coletivo — a gestão e a coesão territorial — e, por outro, um desafio individual — a gestão/utilização do património rústico, muitas vezes herdado, não identificado e quase sempre abandonado. A iniciativa que se propõe, passa pela criação de um sistema integrado de troca voluntária de terrenos rústicos por Certificados de Aforro, promovendo, dessa forma, o emparcelamento e gerando receitas, quer através de explorações agrícolas, quer através da venda de créditos de carbono, num movimento que pretende transformar paisagens, reorganizar e valorizar o território nacional. Portugal enfrenta, há várias décadas, um dos maiores desafios no ordenamento e gestão do seu território rural: a fragmentação extrema da propriedade rústica e o progressivo abandono da atividade agrícola, tendência que se agravou entre 2019 e 2023 (Instituto Nacional de Estatística [INE], 2024). Este abandono está certamente relacionado com a falta de um cadastro predial completo — um dos nossos grandes falhanços coletivos. Segundo o Balcão Único do Prédio (BUPi, 2024), até ao final de 2024, apenas cerca de 50% do território nacional tinha sido alvo de cadastro e registo atualizado. Não se consegue gerir um território cuja metade da sua extensão não tem dono devidamente identificado. Prova disso está no facto de Portugal ter registado mais de 440 mil hectares de área ardida entre 2017 e 2022 (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas [ICNF], 2023). As florestas desordenadas e abandonadas continuam a servir de combustível para alimentar o ciclo de incêndios devastadores. Para responder a estes problemas, e após vários anos a convivermos com esta realidade, surge o programa “Certificados por Território”. O conceito é simples: os proprietários poderiam voluntariamente ceder os seus terrenos rústicos ao Estado e, em contrapartida, receberiam Certificados de Aforro — um instrumento de poupança pública, seguro e com rendimento garantido. Esta é uma solução composta por vários passos. O processo iniciar-se-ia com o registo obrigatório do terreno no Balcão Único do Prédio (BUPi), seguido da avaliação pela Autoridade Tributária. Para facilitar o registo e garantir menos conflitos posteriores (não esqueçamos a possibilidade de sobreposição de polígonos), seria importante envolver os técnicos de cadastro predial, designadamente os Solicitadores Portugueses, profissionais habilitados, conhecedores da componente jurídica e que, através da sua Ordem, deram um passo pioneiro nesta matéria com o lançamento da plataforma Geopredial. A sua colaboração (com forte representatividade no território) permitiria agilizar o processo de identificação e georreferenciação dos terrenos, garantindo maior fiabilidade e celeridade ao programa. Após aceitação do valor de avaliação, os proprietários celebrariam uma escritura pública de permuta, transformando património abandonado em poupança segura. O Estado, por seu lado, agregaria as parcelas adquiridas, promovendo o emparcelamento e criando unidades fundiárias com dimensão economicamente viável. Estas unidades poderiam depois ser vendidas ou concessionadas a jovens agricultores, cooperativas ou autarquias, ou, por outro lado, ser afetas a programas de reflorestação estratégica. No caso da opção pela reflorestação, esta privilegiaria as espécies autóctones, mais resilientes aos efeitos das alterações climáticas e ao risco de incêndio. O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF, 2023) seria responsável pela plantação e certificação das novas florestas. Estas áreas reflorestadas permitiriam a obtenção de créditos de carbono no Mercado Voluntário de Carbono, cujas receitas resultantes da venda seriam reinvestidas na expansão do próprio programa. Uma das inovações desta proposta reside no envolvimento das Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) e das Juntas de Freguesia como possíveis entidades gestoras das áreas reflorestadas. As Juntas, com profundo conhecimento do território e das comunidades locais, estariam bem posicionadas para assegurar uma gestão ativa e sustentável. Adicionalmente, estas entidades poderiam beneficiar de uma nova fonte de rendimento a longo prazo, através da participação nas receitas provenientes da venda de créditos de carbono. O programa “Certificados por Território” apresenta um conjunto abrangente de benefícios, nomeadamente: • Redução do minifúndio e do abandono da propriedade rústica; • Estímulo à atividade económica, agrícola e florestal; • Aumento da área de floresta autóctone e da biodiversidade; • Criação de novas fontes de receita para as freguesias rurais; • Contributo efetivo para o cumprimento das metas de neutralidade carbónica até 2050; • Promoção da literacia financeira e da poupança nacional. Ao articular recuperação fundiária, valorização ambiental e incentivo à poupança, esta proposta poderia transformar um problema estrutural numa oportunidade de desenvolvimento sustentável para Portugal. Está nas nossas mãos transformar o abandono em oportunidade, e garantir que o interior de Portugal tenha, também ele, um amanhã que cante.

"A intimidante combinação de palavras: Inovação Pedagógica", opinião de Joana Regadas
Opinião

"A intimidante combinação de palavras: Inovação Pedagógica", opinião de Joana Regadas

Lê-se num documento lançado pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES): “O crescente acesso de jovens ao Ensino Superior tem colocado problemas de desajustamentos no que concerne às tradicionais metodologias de ensino”. Este documento, datado de 2022, evidencia a necessidade de reformulação do papel do Ensino Superior, reforçando que “deverá voltar-se para o desenvolvimento de pessoas autónomas, dotadas de pensamento crítico e criativo”. No entanto, três anos depois, a combinação de palavras inovação pedagógica parece ainda intimidar muitos docentes e até mesmo estudantes. A realidade é que a Universidade de Aveiro se encontra na vanguarda de implementação destas novas metodologias de ensino e pedagogia, no entanto, esta não é transversal a todos os cursos lecionados, parecendo muitas vezes que somos, ao mesmo tempo, duas universidades em espaços temporais diferentes. Enquanto uns aprendem com metodologias deste século, têm salas idealizadas para estas novas metodologias e são parte ativa do seu processo de aprendizagem e avaliação, tantos outros continuam a aprender com aulas totalmente expositivas, com os mesmos slides de há 10 anos, em salas idealizadas para um ensino de 1973 e sem uma única oportunidade de escolherem como preferem aprender e como podem ser parte ativa da sua formação enquanto cidadãos. Muitas questões se levantam para estas diferenças dentro do mesmo ambiente de estudo. Porque é que nem todos os estudantes podem estar no centro do sistema de aprendizagem? O que impede a aplicação destas metodologias de uma forma transversal? Será relutância por parte do corpo docente, ou então os próprios estudantes estão intimidados com a carga horária adicional que estes novos métodos podem trazer? A verdade é que, atualmente, há um desencontro entre o que o estudante prefere e necessita e o que o sistema de ensino fornece, revelando-se urgente repensar o Ensino Superior, readaptar os currículos, formar o corpo docente, replicar os casos de sucesso - como “Do Marketing às Línguas: A arte da Escrita Criativa” e “ARTE: Aprendizagem Reflexiva através do Teatro para a Transformação Socio-Ecológica” - noutras áreas mais desafiantes e não ter receio das novas tecnologias. Apesar da inovação pedagógica parecer a solução para todos os males do Ensino Superior, é preciso não descurar o delicado equilíbrio que pode introduzir na carga horária. Se é exigido ao estudante que se envolva de forma mais ativa e que despenda de mais tempo para conseguir realizar toda esse trabalho prévio e autónomo, é também necessário que os currículos passem a ser pensados de forma que as unidades curriculares estejam interligadas e promovam a interdisciplinaridade, que acaba por ser a segunda palavra mais intimidadora de todo este processo. Para isso, todos os órgãos envolvidos na construção e avaliação de planos curriculares, como comissões de curso e conselho pedagógico, têm de ser uma parte ativa neste processo. A intimidante combinação de palavras, inovação pedagógica, tem de ser um caminho partilhado, e a inovação não pode partir apenas de um dos lados da sala de aula. Certo é que o caminho é longo e pelo meio surgirão sempre novas metodologias, mais informações, e a teia, já com muitos pontos ligados, torna-se cada vez mais preenchida. No entanto, é por esta mesma razão que é necessário sair do conforto da sala de aula tradicional e repensar o papel de professor e aluno, envolvendo todos na pergunta de milhões “Ǫual é o futuro da educação?”.

"O Estado falhou com a Ana Paula Santos. O Estado somos nós", opinião de Miguel Pedro Araújo
Opinião

"O Estado falhou com a Ana Paula Santos. O Estado somos nós", opinião de Miguel Pedro Araújo

O alarme (09/2024) e o despertar da comunidade (03/2025) foram despoletados pela decisão da autarquia de Loures em demolir as “autoconstruções” (o eufemismo atual para “barracas”), erguidas no bairro do Talude Militar, e pelo constante receio que as mulheres sentem pela possibilidade da retirada das crianças por falta de habitação e consequente institucionalização pelo Estado. O caso de Ana Paula Santos (espelho de centenas de outros casos semelhantes), mediatizado há dias, levou à mobilização da comunidade e de alguns movimentos coletivos. De forma resumida (o caso é público, ainda bem), Ana Paula Santos é uma mulher com 38 anos, natural de São-Tomé, principal núcleo de uma família monoparental, mãe de três filhas (4, 9 e 18 anos) que frequentam a escola, cuidadora de idosos, aufere o salário mínimo, é contributiva, mas sem qualquer apoio estatal. Ana Paula, que vive desde a demolição da sua “autoconstrução” em finais de 2024 numa pensão em situação precária, deu à luz, no dia 18, o pequeno Heitor sob a incerteza de poder ficar com o seu filho e de ter um lugar onde morar após a alta hospitalar. Todos estes pormenores não são, de todo, menores, mas antes ‘pormaiores’. Este caso apresenta-nos duas disfuncionalidades do Estado em matéria de Políticas Públicas em Habitação e Ação Social. Na Habitação, a revogação, por este último Governo, de um conjunto de medidas que estavam, há pouco mais de um ano, a ser implementadas sob a tutela da ex-ministra Marina Gonçalves (PS) afigura-se preocupante. Supostas políticas de benefícios dos (apenas alguns) jovens, o fim do congelamento das rendas (87 mil pessoas ficaram sem o apoio extraordinário à renda), a revogação do programa “Arrendar para Subarrendar” ou a nova lei do uso dos solos, para além de não estagnarem ou inverterem a crise habitacional, originaram a que, em apenas um ano de governação (2024-2025), o preço dos solos rústicos tivesse um aumento médio de 71% (fonte: imobiliária ERA) e o das habitações disparado 10,8%, no início de 2025 (comparando com janeiro de 2024, segundo o INE). Não há outro lado da realidade dura e crua. Ninguém constrói, por belo prazer, uma ‘barraca’ a não ser no limite do desespero e da ausência de qualquer alternativa ou apoio, preferindo, mesmo sem condições, quatro paredes e um teto a viver na rua. Ninguém constrói uma ‘barraca’ a não ser porque o Estado falhou na sua responsabilidade enquanto garante de um direito social fundamental e constitucional: uma casa. O mesmo Estado que, não cumprindo a sua função e missão, numa inqualificável incapacidade política de assumir a sua responsabilidade (como o demonstram as recentes afirmações deploráveis de Maria Palma Ramalho, ministra do Trabalho, que disse, publicamente, que a resposta à crise da habitação não é responsabilidade do Governo, mas sim das autarquias… e disse isto sem se ‘rir’), em vez de agir de forma a ser parte (e uma boa parte) da solução, é fator de incremento do problema. Em muitos casos num manifesto atropelo dos direitos e da lei, por exemplo, a Lei de Bases da Habitação que não permite que alguém seja desalojado sem que, antecipadamente, lhe seja garantida uma alternativa. Demolição por mera demolição gera nova ‘autoconstrução’… é da sobrevivência humana. E hoje assistimos, por exemplo na zona de Lisboa, a um preocupante retrocesso social e civilizacional até aos anos 80. Se por si só todos estes contornos são mais que esclarecedores sobre a forma como o Estado age (ou abstém-se de agir) em relação aos mais frágeis e às minorias, o recente relatório intercalar “Portugal, Balanço Social 2024” indica que cerca de 900 mil trabalhadores (8,9% da população), que auferem um rendimento mensal, encontram-se em situação de pobreza absoluta, muitos deles sem recursos para se poderem abrigar debaixo de um teto (13 mil pessoas viviam, em 2023, em situação de sem-abrigo)… ou que 1,3 milhões de portugueses não possuem recursos financeiros para pagar uma dieta adequada. Sendo que por “dieta adequada” entende-se uma despesa mínima em alimentação de 5,5 euros/dia. Mas as milhares de “Anas Paulas” que existem revelam outra falha do Estado: a das políticas públicas de intervenção social. Como se já não fosse, por si só, degradante, estigmatizante e cáustico ser-se pobre, a irresponsabilidade social do Estado, a sua ineficácia na implementação de políticas de coesão e providência social, a sua ação não é a da solução ou a da resposta. O Estado limitou-se, mal, a penalizar duplamente: por um lado falhou nas políticas de alavancagem social (onde se insere a habitação, o emprego e o salário ou os programas de apoio aos mais vulneráveis) e, por outro lado, age punitivamente sobre a própria coesão familiar e relação mãe-filha(o)s. Sendo que neste caso é, também (e muito), questionável a opção linear da retirada da criança do seio familiar a uma mãe que não maltrata os seus filhos, que os protege, que trabalha, mas que apenas não tem condições (porque a sociedade e o Estado não lhas proporcionam, por inércia e inação) para ter uma habitação digna. A própria Comissão Europeia, tal como lembrou há dias a economista Susana Peralta, em 2024 recomendava que a pobreza não devia ser motivo para que crianças fossem colocadas em cuidados alternativos. Isto porque a Comissão Europeia entende que cabe ao Estado promover políticas públicas e encontrar mecanismos que criem condições que evitem a separação familiar. Aliás, algo que a própria UNICEF sempre proclamou no superior interesse e direitos das crianças. Ao caso, tomemos o exemplo da medida governativa que determina que uma família de acolhimento possa receber o apoio até perto dos 800 euros (quase um salário mínimo) por criança acolhida. Excluindo, por agora, a discussão ética e moral sobre eventual mercantilização do processo de acolhimento, fica difícil perceber o porquê do Estado, perante o que é a realidade e o contexto do caso de Ana Paula, não apoiar a procura de uma habitação digna para esta família e subsidiar o arrendamento com este valor de “acolhimento”. O valor que, provavelmente, entregaria, caso o pequeno Heitor (ou as outras 3 filhas de Ana Paula) fossem institucionalizadas (e só neste processo a despesa pública seria mais elevada) e resultasse um processo de acolhimento por outra família. É óbvio que esta análise é a vertente economicista de uma Política Pública. A realidade é que, em muitas circunstâncias, e nesta em particular, mesmo uma Política Pública é muito mais do que uma despesa pública ou um mero subsídio financeiro. São vidas, afetos, relações familiares e sociais, crescimento humano e o fortalecimento de uma sociedade que se pretende coesa, inclusiva, justa e humanitária. E isso, cabe-nos, também, a nós todos.

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Câmara de Aveiro adjudica construção de pavilhão municipal por 22 milhões de euros
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Câmara de Aveiro adjudica construção de pavilhão municipal por 22 milhões de euros

A empreitada foi adjudicada durante a reunião do executivo municipal por 22.103.700,20 euros, abaixo do preço base do concurso que tinha sido fixado em preço base de 22.790.000 euros, e com um prazo de execução de 540 dias. A proposta de adjudicação foi aprovada com os votos da maioria PSD/CDS-PP e os votos contra dos três vereadores do PS, que também já tinham votado contra a abertura do concurso. Esta foi a terceira tentativa da autarquia para adjudicar a obra, depois de nos dois procedimentos anteriores, as empresas interessadas não terem cumprido os critérios para adjudicação dos respetivos concursos. O novo pavilhão a construir junto ao Estádio Municipal de Aveiro tem sido alvo de contestação por parte do candidato do PS à Câmara de Aveiro, Alberto Souto de Miranda, que fala num "erro estratégico colossal" do atual executivo , por entender que esta infraestrutura "não serve os interesses de Aveiro". Segundo a autarquia, o novo pavilhão desportivo "pretende dar resposta às necessidades da comunidade aveirense", com especial destaque para os programas de "Desporto para os Cidadãos" que a câmara quer desenvolver, e para as associações desportivas com modalidades de pavilhão. O novo pavilhão, que ficará situado junto ao Estádio Municipal de Aveiro/Mário Duarte, será dotado de quatro campos polidesportivos (para a prática de diversos desportos coletivos), sendo um desses campos envolvido por bancadas, com uma capacidade para receber público num total de 2.500 pessoas. Para além dos campos com as respetivas medidas oficiais de cada modalidade, o pavilhão terá um ginásio polivalente (para modalidades individuais), instalações adequadas para os técnicos/treinadores, instalações para uso dos clubes/associações, zonas diversas de apoio, salas para reabilitação de atletas, salas de formação, auditório e sala de estudo. De igual modo, existirá uma área afeta para a equipa da câmara que fará a gestão do equipamento e gestão desportiva municipal, bem como áreas que poderão ser concessionadas, nomeadamente bares de apoio, ginásio e clínica de fisioterapia.

Exposição em Águeda explora a arte urbana no universo digital
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Com curadoria da Ephemeral Ethernal (fundada pelo artista Vhils) a exposição desafia o público, através de instalações imersivas, realidade aumentada, realidade virtual e tecnologia ‘blockchain’, a questionar “o que permanece ‘público’ e ‘autêntico’, numa era em que os muros se estendem para além das ruas e entram no domínio digital”. Em comunicado, a organização destacou que o primeiro espaço da exposição é dedicado ao “mundo das redes sociais enquanto novo espaço público”. “Plataformas como o Instagram e o TikTok são as novas ágoras, onde qualquer pessoa pode interagir com arte, expressar opiniões e participar no diálogo público. Aqui, a arte urbana encontra uma nova visibilidade - não estando restringida aos espaços físicos, alcança uma audiência digital e global. Questionamos: de que forma é que os espaços digitais reformulam a nossa experiência com a arte?”, pode ler-se no comunicado sobre a mostra. De seguida, a mostra vai permitir “descobrir de que forma as novas ferramentas estão a expandir as possibilidades criativas”, enquanto a parte final da exposição pretende “explorar a mutação da noção de propriedade na arte urbana”, referindo-se aos NFT e à tecnologia ‘blockchain’. Patente até 13 de julho, no espaço expositivo do Centro de Artes de Águeda, e com entrada livre, “ADN Digital” conta com a participação dos artistas ±MaisMenos±, AKACORLEONE, Alexandre Farto aka Vhils, Halfstudio, Pedrita, PichiAvo, Tamara Alves, AddFuel, Wasted Rita e Kampus.

FNAM preocupada com falta de médicos na obstetrícia do Hospital da Feira
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FNAM preocupada com falta de médicos na obstetrícia do Hospital da Feira

A medida foi identificada à Lusa por Joana Bordalo Sá, presidente da federação, após uma reunião com médicos de várias especialidades da Unidade Local de Saúde do Entre Douro e Vouga (ULS EDV) – que, a partir da Feira, gere ainda três outros três hospitais no distrito de Aveiro, em concreto os de São João da Madeira, Oliveira de Azeméis e Ovar. “Na área materno-infantil, na obstetrícia, as equipas trabalham de forma extremamente reduzida. Têm dois médicos do quadro e um interno (que é um médico em formação), sendo que, à noite, às vezes não está de serviço nenhum médico do quadro e só há prestadores de serviço, com o interno, que assim nem está a ser tutelado como devia”, declarou. Joana Bordalo Sá mostrou-se preocupada com a componente médica devido a “equipas que estão a funcionar nos mínimos” e nas quais há profissionais “bastante cansados”, e mostrou-se apreensiva também quanto às utentes desse serviço, dado “o risco que esta situação pode representar para as grávidas e os seus bebés”. A presidente da FNAM admitiu que a falta de recursos humanos afeta igualmente outras valências da ULS EDV, “como a de pneumologia”, mas defendeu que a prioridade é o serviço materno-infantil, onde “o problema não pode mesmo ser ignorado”. Na mesma reunião com os médicos do Hospital São Sebastião foi ainda abordado o contexto do corte nacional de eletricidade verificado a 28 de abril, quando essa unidade manteve um funcionamento próximo do normal graças a geradores de energia. Nesse caso, o balanço da FNAM é positivo, mas motiva uma avaliação ao desempenho da tutela. “No apagão foi tudo assegurado, muito graças aos médicos e profissionais de saúde de cada unidade, que vestem a camisola do hospital, e isso é de enaltecer”, realçou Joana Bordalo Sá. Mas, disse, “é necessário que este esforço também seja reconhecido pela administração central, inclusivamente pela ministra [da Saúde] Ana Paula Martins, que até aqui não fez nada para fixar mais médicos no Serviço Nacional de Saúde”, concluiu.

Carlos Azevedo será o novo juiz presidente da Comarca de Aveiro a partir de setembro
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Carlos Azevedo será o novo juiz presidente da Comarca de Aveiro a partir de setembro

As nomeações foram decididas em plenário do CSM, a 06 de maio, que decidiu ainda que na comarca de Bragança a presidência será assegurada em regime de acumulação de funções pela juíza presidente da comarca de Vila Real, algo possível para comarcas de menor dimensão, depois de não terem sido encontrados candidatos com todos os requisitos exigidos. Para as cinco comarcas com novos presidentes “foi deliberado prorrogar as comissões de serviço dos atuais juízes presidentes até 31 de agosto de 2025, de forma a assegurar a transição de funções”, sendo que “as novas nomeações produzem efeitos a partir de 1 de setembro de 2025”. As escolhas tiveram em conta os currículos dos candidatos e a auscultação dos juízes das respetivas comarcas, esclareceu o CSM. Em Aveiro a comarca vai ser presidida pelo juiz de direito Carlos Azevedo, magistrado desde julho de 1999, estando colocado desde 2017 em Santa Maria da Feira, onde coordenou unidades de instância central e local.