"A Universidade do futuro e o papel dos estudantes na sua construção", opinião Paulo Jorge Ferreira
Paulo Jorge Ferreira é reitor da Universidade de Aveiro desde 2018, sendo ainda presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas. É o primeiro reitor da UA formado na própria Universidade. É doutorado em Engenharia Eletrotécnica e professor catedrático no departamento de Eletrónica, Telecomunicações e Informática da UA.
Paulo Jorge Ferreira
OpiniãoA relação entre as universidades e os seus estudantes tem variado ao longo do tempo, em função do contexto social de cada época.
Os estudos gerais, instituições que são precursoras das universidades europeias atuais, surgiram na Idade Média. Dependendo de licença papal, e em boa parte controladas pela Igreja, admitiam estudantes que na sua maioria eram clérigos. Apesar das diferenças de organização entre as instituições, o ensino em si era profundamente hierárquico e o papel dos estudantes muito passivo, com poucas oportunidades de reflexão crítica ou inovação. A criação não era uma prioridade. A Universidade preservava e transmitia o conhecimento.
Durante o Renascimento, o estudo dos clássicos, ciências naturais, astronomia e humanidades alargou a curiosidade científica a outras áreas e as universidades tornaram-se locais de intercâmbio de ideias. Os estudantes passaram a desempenhar um papel mais ativo no avanço da ciência e da cultura e, ao mesmo tempo, na contestação da autoridade, tanto eclesiástica como académica. Esta época marcou uma transição importante: para além de aprendizes, os estudantes passaram a ser também catalisadores de mudanças ideológicas.
O Iluminismo trouxe uma nova visão sobre o papel das universidades, focada na razão e na ciência. As universidades assumiram-se como locais de investigação e o desenvolvimento das ciências naturais e das humanidades abriu novas oportunidades para os estudantes explorarem os seus próprios caminhos, ou os ideais de liberdade, igualdade e justiça.
Com a Revolução Industrial, criou-se o contexto favorável para os estudantes liderarem vários movimentos contra os regimes políticos, como as revoluções de 1848, e terem uma voz mais ativa nos processos políticos e sociais. Desde as revoltas estudantis de maio de 1968, em Paris, até aos movimentos de direitos civis nos Estados Unidos, os estudantes tornaram-se protagonistas na luta pela igualdade e liberdade de expressão e contra regimes autoritários.
Os estudantes exigiram reformas no ensino superior, mas também reformas políticas e sociais. A dinâmica entre estudantes, professores, instituições e o próprio estado foi-se alterando, contribuindo para uma maior abertura e democratização do ensino superior. Em muitos países, a educação superior deixou de ser um privilégio das elites para se tornar uma parte fundamental da educação pública.
Portugal não foi exceção. Durante muitos anos, a educação em Portugal foi instrumentalizada pelo Estado Novo enquanto ferramenta de condicionamento. A anestesia coletiva era facilitada por uma escolaridade obrigatória reduzida, que chegou a ser de apenas três anos. A formatação do pensamento era ajudada por programas e livros únicos, e aprofundada graças à instrução em separado de meninos e meninas. O ensino superior era para uma elite e o seu alargamento tido como um risco.
A crise académica de 1962 mostrou que a anestesia coletiva não era uma anestesia geral. Os estudantes universitários provaram estar bem despertos, unindo-se em torno da liberdade de associação e da autonomia universitária.
No futuro, as universidades e a sua envolvente manterão uma relação profunda e mutuamente transformadora, influenciando-se e moldando-se de forma contínua para responder às exigências de um mundo em constante mudança. A universidade será, como até aqui, marcada pelas transformações sociais, tecnológicas e culturais, e os estudantes continuarão a ter um papel fundamental na sua construção.
A internacionalização será uma das características mais visíveis desse futuro. A globalização tem removido barreiras físicas e culturais, criando um mundo mais interligado. As fronteiras esbateram-se. Os transportes e as comunicações são mais acessíveis e eficientes. A população mundial move-se cada vez mais. A internacionalização será também uma realidade incontornável nas instituições de ensino superior (IES), que afetará toda a comunidade académica e cujo impacto se fará sentir na investigação, cooperação e no ensino.
O número de estudantes internacionais e de docentes e investigadores estrangeiros que procuram IES portuguesas tem crescido substancialmente nos últimos anos, mas pode crescer mais ainda. Segundo dados da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), o número de estudantes internacionais nas IES portuguesas aumentou 85% na última década.
A diversidade de proveniências, de culturas, de línguas e de religiões traz novos desafios ao nível da interação em ambiente multicultural, mas significa também uma oportunidade para os estudantes viverem um ambiente académico multicultural, criativo e propício à inovação. Estes ambientes proporcionam em geral uma visão global do conhecimento e do mercado de trabalho, experiências de vida únicas e aprendizagens mais ricas.
Outro aspeto fundamental relativo à universidade em transformação é a crescente necessidade de requalificação. Com o progresso tecnológico e as transições digital e climática, o ciclo de vida das profissões é cada vez mais curto, surgindo novas necessidades no mercado a um ritmo inédito. Há áreas de elevada procura que há poucos anos simplesmente não existiam e outras cuja relevância daqui a décadas é uma incógnita. A formação inicial é insuficiente para acompanhar todas as mudanças.
O Ensino Superior continuará a atrair jovens estudantes que procuram cursos e diplomas, mas também um número crescente de profissionais interessados em requalificação. Em geral, os segundos têm idades superiores aos primeiros e apresentam percursos, expectativas e objetivos de formação diferentes. A diversidade de estudantes e do tipo de públicos que convergem para o ensino superior será uma marca evidente da universidade do futuro, em termos culturais e geográficos, mas também em termos de trajetórias académicas e profissionais.
A universidade do futuro será um espaço de aprendizagem contínua, onde a transição de “estudante universitário” para “antigo aluno” deixa de ser um acontecimento singular. O “antigo aluno” pode voltar a ser “estudante”, quando necessário. As fronteiras entre os dois estados esbatem-se e a sua relação tornar-se-á mais ténue e fluida. Aprenderemos ao longo da vida, e a universidade será um espaço sempre aberto à reintegração.
A universidade do futuro continuará a envolver os seus estudantes. Hoje, como nunca, estes têm um papel ativo na construção da universidade e da sociedade, questionando estruturas tradicionais e propondo novos caminhos para o futuro. Este processo de evolução contínua reflete a importância dos estudantes enquanto agentes de mudança social e cultural e como cocriadores da experiência universitária.
Com o avanço da tecnologia, o ensino tornou-se mais interativo e acessível. As plataformas de ensino online, o acesso a dados em tempo real e a possibilidade de estudar em qualquer universidade do mundo a distância deram aos estudantes uma maior capacidade de adaptar o seu ensino. A capacidade de adaptação e inovação em ambientes multiculturais e multidisciplinares será essencial para o sucesso da universidade no cumprimento da sua missão, contribuindo ativamente para a sua construção, para a criação conjunta de dinâmicas de ensino e aprendizagem, mais flexíveis, colaborativas e integradas, e de uma universidade mais inclusiva e global.
Recomendações
"Porquê orgulho? Porque ainda não é seguro viver sem medo", opinião de Hugo Filipe Nunes
Junho é o mês do Orgulho LGBTQIA+. É um mês de visibilidade, de luta, de memória e de celebração. Mas, ano após ano, há quem insista em perguntar: “E o orgulho hetero, quando é?” Como se fosse comparável. Como se a história fosse igual para todas as pessoas. Como se o orgulho de quem foi silenciado, perseguido, ridicularizado ou agredido fosse um capricho — e não um ato de resistência. É importante dizer o óbvio: ninguém precisa de um “orgulho hetero” porque ninguém foi jamais espancado por ser heterossexual. Ninguém perdeu o emprego, foi expulso de casa ou ameaçado na rua por andar de mão dada com alguém do sexo oposto. Ninguém se viu forçado a esconder quem é — para sobreviver. O orgulho LGBTQIA+ não nasce da arrogância. Nasce da dor e da recusa da vergonha. É o contrário da superioridade; é uma resposta à humilhação imposta. Estamos em 2025. Portugal é, em muitos aspetos, um país progressista. Temos casamento igualitário, possibilidade de adoção por casais do mesmo sexo, reconhecimento legal da identidade de género, e algumas proteções anti-discriminação. Mas quem acha que “está tudo resolvido” vive numa bolha. As agressões homofóbicas continuam a acontecer. O bullying nas escolas é uma realidade. O acesso a cuidados de saúde competentes e respeitadores da identidade de género continua desigual. E há cada vez mais discursos públicos que ridicularizam ou atacam os direitos conquistados. Este ano, o mês do Orgulho acontece num contexto político particularmente preocupante. Com a extrema-direita a almejar cada vez mais poder, os direitos das pessoas LGBTQIA+ voltaram a ser alvo. Com linguagem disfarçada de “liberdade de expressão” ou “defesa da família”, o que se vê é o retorno de preconceitos já combatidos: a ideia de que somos uma ameaça à infância, de que devemo-nos “manter discretos”, de que exigir respeito é impor uma “agenda”. É neste contexto que surgem também os ataques ao chamado “wokismo”. A palavra “woke”, que começou por significar consciência social e atenção às injustiças, foi capturada e transformada num insulto. Sempre que alguém se indigna com o racismo, com a homofobia, com o sexismo ou com a desigualdade, é imediatamente apelidado de “woke”. Como se lutar por direitos fosse uma moda. Como se combater a exclusão fosse uma fraqueza. É uma estratégia velha: gozar com a linguagem para deslegitimar a causa. Mas as causas permanecem. E são justas. Não é coincidência que, em todos os países onde a extrema-direita governa ou tem alta influencia, os direitos LGBTQIA+ estejam entre os primeiros a serem atacados. A lógica é simples: criar inimigos internos, dividir a sociedade, impor uma moral única. Em nome da tradição, retiram-se direitos. Em nome da ordem, persegue-se a diferença. Mas a resposta a este avanço não pode ser o silêncio. Não podemos baixar os braços, nem tratar a igualdade como garantida. O Orgulho existe precisamente porque o perigo ainda existe. Porque, mesmo com avanços legislativos, o preconceito não desapareceu. Porque cada gesto público de afeto entre duas pessoas do mesmo sexo ainda é, muitas vezes, um ato corajoso. Porque os adolescentes LGBTQIA+ continuam a crescer com medo, sem referências, sem apoio. Enquanto existir medo, vergonha, discriminação ou violência, o orgulho é necessário. Não é provocação; é defesa. Não é espetáculo; é sobrevivência. É dizer “estamos aqui” num mundo que tantas vezes nos quis apagar. E sim, este combate é político. Porque a liberdade e a igualdade não se defendem apenas com boas intenções. Exigem leis, políticas públicas, financiamento a organizações de apoio, campanhas de sensibilização. Exigem coragem de quem governa e de quem representa, mesmo em assembleias de freguesia. Neste junho, que ninguém se cale. Que se pinte, que se dance, que se ocupe o espaço público, que se abracem causas e pessoas. Porque o orgulho não é só de quem é LGBTQIA+. É de todas e todos os que acreditam que ninguém deve ser tratado como cidadão de segunda. Se ser woke é defender quem sempre foi silenciado, então que nunca me falte orgulho de o ser.
"Mudar o Paradigma de Gestão e de Governança da UA", opinião de Filipa Brandão
Mudar o Paradigma de Gestão e de Governança da UA: Um Apelo à Liderança Participativa e à Cocriação de Soluções para o Futuro de Todos Ao celebrar mais de cinco décadas de história, a Universidade de Aveiro encontra-se num momento decisivo. Os desafios que hoje se colocam ao Ensino Superior, as restrições orçamentais, o necessário impacto social do ensino e da investigação, a sobrecarga de trabalho e em muitos casos de burnout dos seus recursos humanos, exigem uma profunda reavaliação dos modelos de liderança e gestão das Instituições de Ensino Superior. Urge transitar de modelos tradicionais de “governo” para abordagens de “governança” bottom-up, que se apoiem no ‘chão da universidade’. No centro desta transformação devem estar lideranças democráticas e transformativas assentes numa participação efetiva de Todos! O Conselho Geral da Universidade deve tornar-se o motor desta mudança. Defendemos um Conselho Geral que promova a eleição direta de todos os órgãos unipessoais, logo que legalmente possível. Que exija audições públicas abertas a toda a comunidade dos candidatos a reitor, o escrutínio aberto dos seus programas, o que é o oposto da atual situação de ‘conclave’ que reina no Conselho Geral. Defendemos um Conselho que envolva diretamente todos os segmentos da comunidade universitária, académicos e não académicos, em início de carreira e seniores, com contratos permanentes ou precários. A representação não pode ser simbólica e de cortesia para com as reitorias. O Conselho Geral deve ser a voz da comunidade e atuar como órgão de fiscalização dos órgãos da universidade: deve ser ativo, dinâmico e consequente. A governança participativa, de base, não é um ideal utópico. É uma exigência democrática. No contexto universitário, significa envolver ativamente quem trabalha e estuda na instituição na definição da sua direção, prioridades e cultura. É um modelo que reconhece os saberes diversos, as experiências vividas e as perspetivas críticas de quem está no terreno. Legitimar a governança bottom-up implica saber-se ser inclusivo e saber-se dialogar. A universidade deve refletir a inteligência coletiva da sua comunidade, o que requer dar poder de participação e decisão a Todos e não apenas às elites dos órgãos eleitos ou designados. Saber-se delegar - e não centralizar funções e decisões - é um ato de gestão inteligente. A governança participativa deve ir além da retórica. Deve estar presente nas estruturas e práticas institucionais do dia a dia. O Conselho Geral tem um potencial único para cumprir esse papel, não como mero validador das atividades do reitor, mas como espaço independente, inclusivo e construtivo de reflexão estratégica, debate e responsabilização. Para isso, precisamos de um Conselho Geral que escute, questione e proponha, que funcione como consciência coletiva da instituição. Esta visão exige uma transformação na cultura institucional. Reconstruir a confiança na governança universitária significa empoderar as pessoas. Significa garantir que docentes sobrecarregados com horas letivas excessivas, investigadores em situação de instabilidade e estudantes que procuram uma formação com sentido sintam que a sua voz conta. Governança não é controlo, é corresponsabilização. E só com corresponsabilidade poderemos construir uma universidade resiliente, inclusiva e preparada para os próximos 50 anos. Escolhamos o diálogo e a empatia com as pessoas, em vez da distância e da voz de comando, a transparência em vez da opacidade, a coragem em vez da gestão do dia a dia. Vamos co-construir a Universidade de Aveiro do futuro, em conjunto. Não para alguns, mas para todos!
“O que se segue depois do desastre eleitoral?”, opinião de Bruno Vilhena
No passado dia 18 de maio, o Partido Socialista (PS) sofreu um desastre. Com toda a certeza, contados os votos da emigração, será a terceira força política na Assembleia da República durante a próxima legislatura. Tendo em conta estes dados, mantive, durante estes dias, um silêncio propositado. Preferi esperar uns dias até organizar bem os meus pensamentos, ouvir e ler o que se foi escrevendo, ter algum tempo para ter opinião e para poder mudar de opinião. Passada uma semana e já com a certeza das diretas para o final de junho – com as quais eu concordo, porque o partido não pode ficar preso a uma liderança interina e sem a legitimidade da militância – é agora tempo de olhar para a frente. O slogan “O Futuro É Já”, ao dia de hoje, quase que parece premonitório. O futuro do PS tem mesmo de ser já. A profunda reflexão que o partido precisa de fazer depois destes resultados não pode significar um partido “fechado para balanço” durante tempo indeterminado. Tem de ser feita e conjugada com a ação concreta no dia a dia da política nacional. O período até às diretas, e das diretas até ao Congresso Nacional, mesmo com as autárquicas pelo meio, deve ser um período para trabalho e discussão aberta e franca sobre o PS que queremos. Existem certamente muitos motivos que levaram o Partido Socialista a ter o resultado desastroso que teve. Assinalarei aqui apenas dois, que são os que me parecem ter tido mais peso na formulação do sentido de voto dos portugueses. O PS não conseguiu reganhar a confiança dos cidadãos eleitores para voltarem a votar nele. Em primeiro, quando apenas pouco mais de um ano passou desde as últimas legislativas e os portugueses consideraram que o governo em funções da AD ainda não teve tempo suficiente para demonstrar a sua incompetência – apesar dos sinais que já existem: um SNS pior hoje do que há um ano, uma economia a descrescer no primeiro trimestre deste ano, o preço da habitação que não parou de aumentar com políticas e medidas desastrosas apenas do lado da procura – e, talvez mais importante; Em segundo, os portugueses continuam a responsabilizar o Partido Socialista – e não estão completamente errados – pelo estado e dimensão a que chegaram os principais problemas que o país enfrenta, sejam eles o estado do SNS, a crise na habitação, ou o estado da imigração. E, por isso, naturalmente, fizeram o juízo de que não voltariam a eleger quem consideram que também esteve na origem do problema. A verdade é que, após a estabilização da economia e o alcance do rigor orçamental com crescimento económico que o PS conseguiu – e conseguiu provar que a esquerda é capaz disso – nos seus primeiros anos de governação pós-2015, perdeu-se uma oportunidade histórica para reformar o país e, em consequência, o nosso tecido produtivo. Não por falta de soluções ou de bases lançadas, que as foram: na habitação, na saúde, nos transportes; mas por um sentimento – tão nosso, aliás – de que não é preciso ter pressa, que vamos com calma, vamos gerindo. Errámos. Os problemas agravaram-se e as pessoas responsabilizaram-nos e continuaram a fazê-lo. Esse é o tipo de eleitorado que só se recupera com tempo e seriedade, e não em clima de instabilidade. Nesse aspeto, Pedro Nuno Santos não teve sorte. Eleito secretário-geral em circunstâncias muito difíceis, lidou logo com umas eleições antecipadas, seguidas de umas europeias complicadas. Nem um ano depois, umas novas legislativas antecipadas e, tudo isto, em pouco mais de um ano de liderança do partido. Teve o sentido de Estado que devia no momento em que o país vivia, viabilizando um Governo e um Orçamento do Estado com os quais não concordava e chumbando moções de censura a esse Governo com o qual não concordava. Furtou-se sempre, e bem, à tática política e acabou por ser essa rejeição da tática, aliada a um Governo que criou todas as crises que podia para entalar o maior partido da oposição, que ajudou a provocar eleições e não deu ao PS o tempo suficiente para se renovar e se reapresentar como uma alternativa de governo. Nesse aspeto, foi difícil fazer melhor, e teria sido sempre mais fácil dobrar a espinha e dar o dito por não dito, conservando o Governo. Quanto ao futuro da liderança do partido, que já parece mais ou menos resolvido, há pouco mais de um ano subscrevi e propus a candidatura de Pedro Nuno Santos a secretário-geral do PS, fiz campanha por ele, votei nele, fui delegado ao Congresso do PS numa lista adstrita à sua candidatura. Acho que o PS tem de estar mais próximo da social-democracia – forte defensora do Estado Social e do papel do Estado para a resolução das crises que vivemos, e até de uma raiz mais trabalhista e virada para o mundo trabalho – do que de um centrismo iluminado que deixa ao mercado a resolução de tudo e usa a “esquerda” meramente como um token para sinalização de virtude. Sei que, por motivos históricos, até, a base eleitoral do PS sempre foi mais burguesa do que operária, mas primeiro perdemos os burgueses e agora até os operários. Não foi pelas circunstâncias terem mudado que estes meus princípios também mudaram e é isso que continuarei a defender como a melhor resposta para o país. Os tempos que se vão seguir serão sempre terríveis para o PS tendo em conta que hoje lidamos com uma extrema-direita parlamentar perfeitamente estabelecida. Aí, o PS não pode cometer o erro de querer lutar para liderar a oposição. O PS tem de lutar para liderar o país. Para isso, não só tem de ter uma alternativa de governo bem preparada, mas tem de estar no terreno. As alternativas não se constroem fechadas numa sala, os nossos autarcas e candidatos autárquicos, que dentro de meses vão a jogo por todo o país, sabem isso melhor do que ninguém. O PS tem de sentir os problemas dos portugueses e assumi-los como seus e deixar de falar para nichos que se vão encolhendo à medida que o tempo passa. O PS tem de voltar a ter um projeto aspiracional para o país em que os portugueses se revejam e não uma lista de compras e de medidas para nichos. Caso não o façamos, estas eleições já provaram mais uma vez que quem absorve o descontentamento não correspondido não é o PS. Uma última nota sobre o voto jovem. Já há dois atos eleitorais que o PS não conquista mais de 20% dos votos nos eleitores entre os 18 e os 34 anos. Existem vários motivos para isso, como o facto de uma geração de novos votantes ter crescido e ganhado consciência política durante um longo período de governação do Partido Socialista, em que associam com naturalidade os problemas do país a quem o governou durante esse período. Mas a minha pergunta é: esta tendência não é nova, o que tem feito e para que tem servido a Juventude Socialista?
"Depois das eleições: a esquerda combativa continua a fazer falta", opinião de Hugo Filipe Nunes
As eleições legislativas do passado 18 de maio deixaram um país politicamente mais à direita. A AD venceu com folga, o Chega obteve um resultado bastante expressivo e, do lado da esquerda, muitos ficaram com uma sensação de travessia no deserto. O Bloco de Esquerda perdeu representação parlamentar e, na verdade, em todo o país houve uma retração da força política transformadora da esquerda. Em Aveiro — tanto no distrito como no concelho —, e também em Esgueira, os resultados foram igualmente desanimadores. Aqui na freguesia, o Bloco ficou pelos 2,37%, e quase um quarto das pessoas votou num partido de extrema-direita. Tendo participado várias vezes como membro substituto na Assembleia de Freguesia de Esgueira, esses números preocupam-me profundamente. Mas, como cidadão, preocupam-me ainda mais. São reflexo de um descontentamento social real que a direita populista conseguiu explorar, muitas vezes sem apresentar soluções concretas, baseando-se apenas em discursos fáceis e oportunísticos. Não me iludo: o desfecho destas eleições é um sinal claro de que temos muito trabalho pela frente. Ainda assim, não desisto. Não é a primeira vez que lutamos em minoria. É o nosso pior resultado? É! Mas sei bem que a força das ideias não se mede apenas pelo número de cadeiras no Parlamento. Também me preocupa o momento difícil que, internamente, o próprio Bloco de Esquerda atravessa, com críticas públicas à direção e o adiamento da convenção nacional — uma decisão que, mesmo compreensível num ano em que ainda vamos ter eleições autárquicas, não deixa de acentuar a sensação de impasse. Continuo a acreditar — com a mesma firmeza — que a justiça social, a defesa dos serviços públicos, o combate às alterações climáticas e a luta contra todas as formas de discriminação são causas que valem a pena. E que continuam a precisar de vozes, de corpos e de ação política. A democracia não é só votar de quatro em quatro anos. É intervir todos os dias, especialmente aqui, onde vivemos. É também nas pequenas decisões — sobre parque infantil acessível a todas e a todos, a colocação de uma passadeira ou a gestão transparente de um subsídio — que se joga a confiança nas instituições e na democracia. A política local molda diretamente a vida das pessoas. É por isso que continuo presente e ativo em Esgueira porque acredito que a política local pode ser um espaço real de resistência e de construção. Quando exigimos dignidade no tratamento dos espaços públicos, quando lutamos por orçamentos participativos que realmente funcionem, quando questionamos decisões tomadas de forma opaca, estamos a fazer política a sério. E quando defendemos que a ação social deve incluir todas as pessoas — também as LGBTQIA+, as que vivem com baixos rendimentos, as que sentem diariamente o peso da exclusão e as pessoas com deficiência — estamos a defender, na prática, os valores de Abril. Sim, os resultados eleitorais foram duros. Sim, é fácil cair no desânimo e na frustração. Mas nunca foi nos momentos fáceis que as grandes conquistas aconteceram. O salário mínimo, a escola pública, o Serviço Nacional de Saúde, os direitos laborais, as pensões, a ação social — tudo isso foi conquistado com persistência, coragem e, muitas vezes, em clara minoria. Cada uma dessas vitórias teve por trás rostos anónimos: trabalhadoras e trabalhadores, estudantes, cuidadoras e cuidadores, cidadãs e cidadãos comuns que decidiram não se calar. A política não é feita apenas de nomes conhecidos ou figuras públicas — é feita, sobretudo, da persistência diária e das convicções profundas das pessoas comuns. Este é o momento de não baixar os braços. A extrema-direita cresce quando há medo, desilusão e silêncio. A melhor resposta é continuar a agir: manter presença, apresentar propostas concretas, estar sempre ao lado de quem precisa de apoio. Mesmo que sejamos poucos. Mesmo que não seja popular. Mesmo que seja difícil. E se ainda estou aqui é porque me recuso a aceitar como inevitável ou a normalizar o rumo que o nosso país está a tomar. Não aceito que o cinismo, o ódio e a violência gratuita se tornem algo normal e aceitável. E porque continuo a acreditar que a política pode — e deve — melhorar concretamente a vida das pessoas. Mesmo em minoria, continuo a lutar. Como sempre! E a representar tantas outras minorias. Aqui. Em Esgueira. Porque é aqui que a democracia também se defende.
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Conselho Geral da UA já tomou posse e decidiu quanto à cooptação dos membros externos
Os membros eleitos para o CG no passado dia 3 de junho tomaram posse esta segunda-feira e reuniram pela primeira vez, cumprindo com o Regulamento da Eleição, para proceder à cooptação dos membros do Conselho Geral da UA. Luís Castro, conselheiro eleito pela Lista ‘UA2030’, foi quem presidiu à primeira assembleia, conforme consta no regulamento. À Ria, Luís Castro apontou o caráter sigiloso da reunião, frisando, no entanto, que a mesma decorreu com “normalidade”. O ponto único – a apresentação de propostas para os cinco membros externos a cooptar – foi discutido e “terminou de maneira efetiva: digamos que até de forma diferente de anos anteriores, em que houve necessidade de vários dias para chegar à conclusão”, indica Luís Castro. Note-se que a presidência do CG será assumida por um dos membros cooptados, assim que os convites forem aceites. Caso algum dos membros não aceite o convite, o CG terá de voltar a reunir para apresentar e votar novas propostas. A cerimónia de tomada de posse contou com o discurso de Paulo Jorge Ferreira, reitor da UA, que enalteceu e agradeceu ao CG cessante, frisando as “provas” que este deixou. “Como reitor sinto que não poderia alcançar tanto nem ir tão longe se não fosse com o apoio, com o discernimento e com a ajuda do Conselho Geral”. Neste seguimento, o reitor destacou ainda “os membros externos” pelo “ato de generosidade, de altruísmo e de abnegação” ao ajudarem a universidade “a pensar no seu futuro”, bem como a conhecê-la e a recomendá-la. Sobre o presidente cessante do CG, Paulo Jorge Ferreira deixou também um “agradecimento especial”. “Perante todos os momentos, (…) demonstrou altruísmo, paciência, dedicação e generosidade com o seu tempo que eu considero inexcedível”, refletiu. Por sua vez, António Oliveira, presidente cessante do CG, dirigiu uma palavra aos novos membros realçando que “farão o melhor e contribuirão para o desenvolvimento, progresso e afirmação da Universidade de Aveiro, não só no âmbito das instituições de ensino superior, mas também na interação com os outros órgãos da universidade e com a região”. Numa nota final, Paulo Jorge Ferreira aproveitou ainda a ocasião para agradecer a todos os que colaboraram na realização do ato eleitoral, sublinhando o CG entretanto eleito como “uma mudança boa”. “É também o momento para nós pensarmos um bocadinho acerca da trajetória passada e do que conseguimos fazer juntos”, exprimiu.
Autárquicas: Movimento Juntos pela Murtosa candidata Paulo Amorim a presidente da Câmara
Professor do ensino secundário, Paulo Teixeira de Amorim aponta “um novo rumo para a Murtosa”, no distrito de Aveiro, e propõe “a rutura com o comodismo e o marasmo na gestão autárquica”, afirmando ser uma candidatura suprapartidária. O Juntos pela Murtosa, disse, “procura trazer para o centro de participação gente com qualidade, para além do universo partidário”, e “envolver a malta jovem que tem tido um absentismo grande, procurando chamá-la à decisão de uma forma pragmática e ativa na construção de ideias para o Município”. “Não chega à Murtosa ser um concelho simpático, calmo e pacato”, afirmou o candidato, para quem “é tempo de ser um município ambicioso, criativo, moderno e inclusivo”, apostando num planeamento urbanístico a médio e longo prazo e na dinamização do turismo, nomeadamente aproveitando as potencialidades da praia da Torreira, como vetores de desenvolvimento. Na apresentação pública das listas do “Juntos pela Murtosa”, que decorreu na noite de quarta-feira e contou com a presença do ex-presidente da Câmara de Aveiro Élio Maia, Paulo Teixeira de Amorim defendeu “um concelho que planeia com visão, que ouve antes de agir, que investe com critério e que cuida de todos sem deixar ninguém para trás”. A intervenção do candidato independente não poupou críticas ao atual executivo municipal, afirmando que “faz a gestão do imediatismo, sem ambição e visão estratégica”. “A Murtosa tem vindo a perder vitalidade e vive um clima de apatia”, concluiu. Paulo Amorim é o segundo candidato conhecido à presidência da Câmara da Murtosa, depois de Augusto Leite ser anunciado como cabeça de lista do PS. A Câmara da Murtosa, presidida pelo social-democrata Januário Cunha, conta com cinco eleitos, quatro do PSD e um do PS.
UA e Ordem dos Engenheiros assinam protocolo para alinhar ensino e mercado de trabalho
O protocolo visa estreitar sinergias entre o ensino superior e o setor da engenharia, promovendo uma maior articulação entre a academia e as exigências do mercado. Na ocasião, Fernando de Almeida Santos, bastonário da Ordem dos Engenheiros, destacou o alinhamento estratégico entre as duas instituições. "Cabe-nos dizer que estamos inteiramente sintonizados com a perspetiva do ensino superior na engenharia em Portugal e particularmente com as escolas deste consórcio”, afirmou. Embora tenha reconhecido que ainda há "muito trabalho a fazer", destacou a importância de um progresso contínuo: "É bom que o conhecimento vá aumentando” e que se intensifique a criação de “pontes e o reconhecimento mútuo” entre ambas as partes. Entre os objetivos centrais do protocolo, destaca-se o compromisso com o alinhamento da formação em engenharia aos mais exigentes padrões europeus. A Ordem dos Engenheiros é, atualmente, a única entidade em Portugal acreditada para atribuir o selo EUR-ACE®, no âmbito da ENAEE (European Network for Accreditation of Engineering Education). Este selo, reconhecido internacionalmente, atesta a qualidade dos cursos de engenharia e assegura que os diplomados estão preparados para competir num mercado de trabalho global e exigente. O bastonário agradeceu ainda à UA pela assinatura do protocolo, considerando-o “mais um motivo de orgulho e mais um passo importante para a Universidade de Aveiro”. Além da assinatura do protocolo, o evento contou ainda com uma sessão que integrou também dois painéis de debate no âmbito do tema “As Microcredenciais e o Ensino ao Longo da Vida”, reunindo dirigentes académicos, especialistas e representantes de empresas. O primeiro painel abordou “A Formação ao Longo da Vida e a Atualização de Competências dos Engenheiros em resposta aos desafios do Sector Industrial” e contou com intervenções de Ana Santana, responsável do departamento de recursos humanos do Grupo Grestel; Pedro Ribeiro, diretor de R&D da Bosch Aveiro e Élio Cardoso, diretor geral da Embeiral Construction. Já o segundo painel debateu “Os Novos Modelos de Ensino e as Novas Tecnologias, as propostas da Academia”, com a participação de Paulo Jorge Ferreira, reitor da UA, António Gouveia, presidente da Escola Superior de Tecnologia e Gestão - Politécnico de Viseu e Isabel Lança, presidente da Região Centro da Ordem dos Engenheiros. Ambas as sessões tiveram como objetivo central debater a importância das microcredenciais como “instrumentos de certificação de aprendizagens obtidas em formações curtas e específicas, permitindo que os engenheiros adquiram e comprovem competências de forma ágil e ajustada às necessidades do mercado”, tal como noticiado, anteriormente, pela Ria.
Dragagens em curso reforçam condições de navegabilidade no Porto de Aveiro
São três as intervenções que têm vindo a ser levadas a cabo, desde o passado mês de maio: a dragagem de manutenção dos fundos do setor comercial do Porto de Aveiro, a empreitada de dragagem de manutenção do Porto de Pesca Costeira e da entrada da dársena e a dragagem de manutenção do Porto de Pesca do Largo e do canalete. “Os inertes retirados das zonas intervencionadas estão a ser depositados na zona da Costa Nova”, dá nota a administração do Porto de Aveiro. As intervenções representam um investimento global superior a 2,5 milhões de euros, e “reforçam o compromisso do Porto de Aveiro com a modernização das suas infraestruturas, assegurando maiores níveis de segurança, sustentabilidade e eficiência nas operações portuárias”, repara a administração do Porto de Aveiro em nota enviada às redações. Os trabalhos estão a ser executados pelas empresas MMS Dragagens (Portugal) e Rohde Nielsen (Dinamarca).