RÁDIO UNIVERSITÁRIA DE AVEIRO

Opinião

"Sobre a eleição do CG-UA: ou a importância das condições iniciais", opinião de Armando Machado

Armando Machado doutorou-se em Psicologia na Universidade de Duke (EUA). É professor catedrático no Departamento de Educação e Psicologia da Universidade de Aveiro (DEP-UA) e presidiu à Society for the Quantitative Analysis of Behavior (EUA) e à Associação Portuguesa de Psicologia Experimental. É candidato pelo movimento "UA50 – 50 Anos de História, 50 Anos de Ambição", pela Circunscrição C (Ciências Sociais, Artes e Humanidades), ao Conselho Geral da Universidade de Aveiro.

"Sobre a eleição do CG-UA: ou a importância das condições iniciais", opinião de Armando Machado
Armando Machado

Armando Machado

Opinião
21 mai 2025, 10:13

“Então você ousou criticar o seu supervisor?” A pergunta surpreendeu-me. Ao preparar o encontro com o vice-reitor da universidade que acabara de me contratar, esperava uma conversa cordial para esclarecer dúvidas sobre o início de carreira num país estrangeiro. Não contava que tivesse lido um artigo meu e logo aquele em que criticava ideias do meu orientador.

Ainda assimilava o choque quando outra pergunta me comoveu: “Como posso ajudá-lo? Queremos que tenha êxito na Universidade de Indiana.” Conversámos sobre a remodelação do laboratório, o financiamento para equipamento, a prioridade na admissão de um doutorando, a carga letiva reduzida no primeiro ano — tudo para viabilizar, desde logo, a investigação que eu pretendia desenvolver.

Falámos também das exigências para a nomeação definitiva (tenure), da vida familiar, dos seguros de saúde e de muito mais. Cordialidade? Sim. Mas também um interesse genuíno no sucesso de um jovem cientista, uma atenção redobrada às condições iniciais do seu trabalho e uma rara empatia por quem desorientado com o processo de contratação ficara perplexo com as expectativas da instituição. Ainda hoje, muitos anos depois, recordo o vice-reitor para quem o êxito de um académico era o êxito de toda a academia.

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A forma como a universidade portuguesa acolhe jovens docentes e investigadores é, infelizmente, bem diferente — por vezes, o oposto. Há muitas razões, a começar pela escassez crónica de recursos. Mas outras, menos visíveis, são talvez mais importantes: os valores que promovemos e os ambientes que criamos.

Quando damos mais importância ao número de artigos ou aos montantes de financiamento do que ao valor das ideias e descobertas, alimentamos o filistinismo em detrimento da curiosidade e da paixão pelo conhecimento. Quando contratamos um investigador sem garantir os meios mínimos para começar, ignoramos as condições iniciais que moldam o seu percurso.

Quando sobrecarregamos uma docente recém-chegada com disciplinas fora da sua área, destruímos a sua motivação e revelamos indiferença perante o seu mal-estar.

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Uma academia que não responde ao comportamento dos seus membros empobrece os seus repertórios de ação. Quando docentes empenhados ficam com a voz enrouquecida — “não do canto, mas de ver que [vêm] cantar a gente surda e endurecida” — é natural que alguns caiam na desesperança aprendida e se afastem da vida universitária ativa.

Do mesmo modo, quando investigadores mantêm vínculos precários apesar do esforço e mérito, não surpreende que alguns (os mais brilhantes?) abandonem a academia.

Uma liderança que decide sem explicar, que impõe pelo poder e não pela razão, transforma a academia num ambiente aversivo. Publicamente, promove o silêncio ou o conformismo; em privado, sufoca a imaginação. Em ambos os casos, enfraquece a crença no ideal universitário do primado da razão. O controlo aversivo é, afinal, o oposto do ethos académico.

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O que tem isto a ver com o Conselho Geral da Universidade de Aveiro? Tudo. Porque tudo começa pelas condições iniciais. Votar na Lista UA50 – 50 Anos de História, 50 Anos de Ambição é o primeiro passo para uma universidade:

• Mais inteligente, que garanta meios a quem chega e invista na sua carreira;

• Mais pró-social, que coloque a cooperação interna no centro e a competição externa na periferia;

• Mais inclusiva e plural, que valorize argumentos e não silencie vozes dissonantes;

• Mais justa, por reconhecer a diversidade das áreas e os seus diferentes critérios de qualidade;

• Mais eficiente, onde a administração sirva o trabalho criativo de docentes e investigadores.

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Se te revês neste sonho de construir uma universidade diferente, vota na Lista UA50. Estarás a lançar a primeira pedra de uma academia que cultiva o potencial de todos os seus membros, com especial atenção aos mais jovens docentes e investigadores.

“Há quem veja o mundo como ele é e pergunte porquê. Eu vejo o mundo como podia ser e pergunto: porque não?”John F. Kennedy

Recomendações

"Afinal o que está errado com o Plano de Pormenor do Cais do Paraíso?", opinião de Fernando Nogueira
Opinião

"Afinal o que está errado com o Plano de Pormenor do Cais do Paraíso?", opinião de Fernando Nogueira

Quase tudo! O Plano de Pormenor é um ardil para dar legitimidade política e legal a um processo de licenciamento “por antecipação”, engrenado num cálculo privado de viabilidade financeira. 1 - A proposta de elaboração do Plano de Pormenor (PP) decorre da vontade política do presidente da Câmara e da sua governação de verem concretizado um hotel naquele espaço da cidade, assumida previamente a qualquer discussão estruturada sobre a conveniência de autorizar o referido empreendimento ou sobre os pressupostos e objetivos que deviam orientar a transformação daquela parcela de território. 2 - O PP é um “fato à medida” para o referido empreendimento. Mesmo antes da decisão de elaborar o plano, em janeiro de 2019, Ribau Esteves assumiu publicamente a necessidade de acomodar “os pressupostos dos promotores do investimento em causa [que] não parecem flexíveis em relação à ideia ‘em cima da mesa’” porque, como afirmou, “Se não for assim, não o vamos ter”. Não é inusitado um PP servir para apoiar intenções de investimento privadas, se acautelado o interesse coletivo. Mas esse foi atropelado desde os pressupostos: o projeto, inflexível, dos investidores estabelece a altura e volumetria e a Câmara dá o seu aval, defendendo que o mesmo decorre “da inerente viabilidade económico financeira da intervenção”. O Plano de Pormenor é um ardil para dar legitimidade política e legal a um processo de licenciamento “por antecipação”, engrenado num cálculo privado de viabilidade financeira. 3 - É boa prática urbanística que a execução de um PP seja feita por meio de perequação. Ou seja, todos os que têm capacidade de edificação devem ser considerados na proposta de urbanização. A Câmara considerou desnecessário proceder dessa maneira, adiantando ter sido adotado o sistema de “cooperação” (aspas no original) para a execução do plano. Da leitura do relatório do PP fica claro que a referida “cooperação” é apenas uma astúcia semântica, uma vez que aos restantes proprietários restará escolherem entre venderem as suas parcelas aos investidores do hotel, se estes lhas quiserem comprar, ou serem expropriados nos termos da lei, por força do próprio PP. Talvez por causa deste expediente de retórica, escape à CCDR a ultrapassagem de direitos consignados na lei que aqui se prefigura. 4 - Noutro registo, é curioso que seja a própria autoridade do Turismo a considerar que a solução edificatória pode não contribuir para a valorização turística da cidade. O parecer da Turismo de Portugal I. P. refere “Sobre o número de pisos previsto (12) para a Parcela P6, significativamente acima da envolvente, afigura-se que tal solução poderá traduzir-se numa dissonância urbanística, não concorrendo para a qualidade da paisagem urbana e, por esta via, para a valorização turística da cidade, matéria que, contudo, competirá à Câmara Municipal melhor aferir”. Este parecer, remete para o facto de a cidade ser território comum e para a maneira como ela pode ser apropriada por alguns com impactos na urbanidade de todos. Remete também a decisão para a CMA. A volumetria é discutível em termos estéticos e paisagísticos, mas também quanto às cargas sobre as infraestruturas e serviços urbanos e sobre as questões económicas e ambientais. É meu entendimento que matérias desta natureza não deveriam ser decididas pela Câmara de forma unilateral, nem sustentadas num processo de discussão pública de “faz de conta”. 5 - Oportunisticamente, o período de participação dos cidadãos e entidades da sociedade civil ocorre em agosto e está sujeito ao costumeiro processo de receção de “críticas e sugestões” pelo executivo, que as ponderará a recato de qualquer discussão coletiva, com base em “racionalidades prévias”. Cinicamente, refere-se no preâmbulo do PP que “Contamos, como sempre, com a participação ativa dos Cidadãos, das Empresas, das Instituições Públicas e de todos os que acreditam no potencial de crescimento e de desenvolvimento de Aveiro.” O princípio, esse, é o mesmo de sempre: se não houver nada ilegal, pode (e deve) fazer-se. 6 - Finalmente, o debate que decorre na esfera pública está enviesado. É voz corrente de que ali se fará um hotel e esse tem sido o “objeto” da discussão. O relatório do PP, referencia o conteúdo funcional do empreendimento como tratando-se de “um novo edifício destinado a hotel com oferta de serviços complementares, integrando, nomeadamente, valências funcionais de apoio ao turismo de negócios, eventos e atividades culturais.” Escapará ao leitor menos atento, que não se debruce sobre o Regulamento do PP, que no seu artigo 16º, nº2, se estabelece que “A capacidade máxima do empreendimento turístico é de 600 (seiscentas) camas instaladas em 300 (trezentas) unidades de alojamento (UA), das quais 50, no máximo, podem ser apartamentos.” Na verdade, até podem ser apartamentos em regime de apart-hotel, mas negócio bem diferente do da hotelaria, e da posição assumida pela Câmara em defesa da promoção do hotel, resultará da autonomização e promoção imobiliária destes 50 apartamentos. Cumpre-me denunciar, enquanto cidadão, professor de urbanismo e vereador em exercício, que a CMA promove, com sentido de propósito, a entorse de direitos privados e do direito de todos à cidade, usando os instrumentos de urbanismo em sentido contrário ao dos pressupostos que, em primeira instância, levaram à criação dos mesmos.

"Porquê orgulho? Porque ainda não é seguro viver sem medo", opinião de Hugo Filipe Nunes
Opinião

"Porquê orgulho? Porque ainda não é seguro viver sem medo", opinião de Hugo Filipe Nunes

Junho é o mês do Orgulho LGBTQIA+. É um mês de visibilidade, de luta, de memória e de celebração. Mas, ano após ano, há quem insista em perguntar: “E o orgulho hetero, quando é?” Como se fosse comparável. Como se a história fosse igual para todas as pessoas. Como se o orgulho de quem foi silenciado, perseguido, ridicularizado ou agredido fosse um capricho — e não um ato de resistência. É importante dizer o óbvio: ninguém precisa de um “orgulho hetero” porque ninguém foi jamais espancado por ser heterossexual. Ninguém perdeu o emprego, foi expulso de casa ou ameaçado na rua por andar de mão dada com alguém do sexo oposto. Ninguém se viu forçado a esconder quem é — para sobreviver. O orgulho LGBTQIA+ não nasce da arrogância. Nasce da dor e da recusa da vergonha. É o contrário da superioridade; é uma resposta à humilhação imposta. Estamos em 2025. Portugal é, em muitos aspetos, um país progressista. Temos casamento igualitário, possibilidade de adoção por casais do mesmo sexo, reconhecimento legal da identidade de género, e algumas proteções anti-discriminação. Mas quem acha que “está tudo resolvido” vive numa bolha. As agressões homofóbicas continuam a acontecer. O bullying nas escolas é uma realidade. O acesso a cuidados de saúde competentes e respeitadores da identidade de género continua desigual. E há cada vez mais discursos públicos que ridicularizam ou atacam os direitos conquistados. Este ano, o mês do Orgulho acontece num contexto político particularmente preocupante. Com a extrema-direita a almejar cada vez mais poder, os direitos das pessoas LGBTQIA+ voltaram a ser alvo. Com linguagem disfarçada de “liberdade de expressão” ou “defesa da família”, o que se vê é o retorno de preconceitos já combatidos: a ideia de que somos uma ameaça à infância, de que devemo-nos “manter discretos”, de que exigir respeito é impor uma “agenda”. É neste contexto que surgem também os ataques ao chamado “wokismo”. A palavra “woke”, que começou por significar consciência social e atenção às injustiças, foi capturada e transformada num insulto. Sempre que alguém se indigna com o racismo, com a homofobia, com o sexismo ou com a desigualdade, é imediatamente apelidado de “woke”. Como se lutar por direitos fosse uma moda. Como se combater a exclusão fosse uma fraqueza. É uma estratégia velha: gozar com a linguagem para deslegitimar a causa. Mas as causas permanecem. E são justas. Não é coincidência que, em todos os países onde a extrema-direita governa ou tem alta influencia, os direitos LGBTQIA+ estejam entre os primeiros a serem atacados. A lógica é simples: criar inimigos internos, dividir a sociedade, impor uma moral única. Em nome da tradição, retiram-se direitos. Em nome da ordem, persegue-se a diferença. Mas a resposta a este avanço não pode ser o silêncio. Não podemos baixar os braços, nem tratar a igualdade como garantida. O Orgulho existe precisamente porque o perigo ainda existe. Porque, mesmo com avanços legislativos, o preconceito não desapareceu. Porque cada gesto público de afeto entre duas pessoas do mesmo sexo ainda é, muitas vezes, um ato corajoso. Porque os adolescentes LGBTQIA+ continuam a crescer com medo, sem referências, sem apoio. Enquanto existir medo, vergonha, discriminação ou violência, o orgulho é necessário. Não é provocação; é defesa. Não é espetáculo; é sobrevivência. É dizer “estamos aqui” num mundo que tantas vezes nos quis apagar. E sim, este combate é político. Porque a liberdade e a igualdade não se defendem apenas com boas intenções. Exigem leis, políticas públicas, financiamento a organizações de apoio, campanhas de sensibilização. Exigem coragem de quem governa e de quem representa, mesmo em assembleias de freguesia. Neste junho, que ninguém se cale. Que se pinte, que se dance, que se ocupe o espaço público, que se abracem causas e pessoas. Porque o orgulho não é só de quem é LGBTQIA+. É de todas e todos os que acreditam que ninguém deve ser tratado como cidadão de segunda. Se ser woke é defender quem sempre foi silenciado, então que nunca me falte orgulho de o ser.

"Mudar o Paradigma de Gestão e de Governança da UA", opinião de Filipa Brandão
Opinião

"Mudar o Paradigma de Gestão e de Governança da UA", opinião de Filipa Brandão

Mudar o Paradigma de Gestão e de Governança da UA: Um Apelo à Liderança Participativa e à Cocriação de Soluções para o Futuro de Todos Ao celebrar mais de cinco décadas de história, a Universidade de Aveiro encontra-se num momento decisivo. Os desafios que hoje se colocam ao Ensino Superior, as restrições orçamentais, o necessário impacto social do ensino e da investigação, a sobrecarga de trabalho e em muitos casos de burnout dos seus recursos humanos, exigem uma profunda reavaliação dos modelos de liderança e gestão das Instituições de Ensino Superior. Urge transitar de modelos tradicionais de “governo” para abordagens de “governança” bottom-up, que se apoiem no ‘chão da universidade’. No centro desta transformação devem estar lideranças democráticas e transformativas assentes numa participação efetiva de Todos! O Conselho Geral da Universidade deve tornar-se o motor desta mudança. Defendemos um Conselho Geral que promova a eleição direta de todos os órgãos unipessoais, logo que legalmente possível. Que exija audições públicas abertas a toda a comunidade dos candidatos a reitor, o escrutínio aberto dos seus programas, o que é o oposto da atual situação de ‘conclave’ que reina no Conselho Geral. Defendemos um Conselho que envolva diretamente todos os segmentos da comunidade universitária, académicos e não académicos, em início de carreira e seniores, com contratos permanentes ou precários. A representação não pode ser simbólica e de cortesia para com as reitorias. O Conselho Geral deve ser a voz da comunidade e atuar como órgão de fiscalização dos órgãos da universidade: deve ser ativo, dinâmico e consequente. A governança participativa, de base, não é um ideal utópico. É uma exigência democrática. No contexto universitário, significa envolver ativamente quem trabalha e estuda na instituição na definição da sua direção, prioridades e cultura. É um modelo que reconhece os saberes diversos, as experiências vividas e as perspetivas críticas de quem está no terreno. Legitimar a governança bottom-up implica saber-se ser inclusivo e saber-se dialogar. A universidade deve refletir a inteligência coletiva da sua comunidade, o que requer dar poder de participação e decisão a Todos e não apenas às elites dos órgãos eleitos ou designados. Saber-se delegar - e não centralizar funções e decisões - é um ato de gestão inteligente. A governança participativa deve ir além da retórica. Deve estar presente nas estruturas e práticas institucionais do dia a dia. O Conselho Geral tem um potencial único para cumprir esse papel, não como mero validador das atividades do reitor, mas como espaço independente, inclusivo e construtivo de reflexão estratégica, debate e responsabilização. Para isso, precisamos de um Conselho Geral que escute, questione e proponha, que funcione como consciência coletiva da instituição. Esta visão exige uma transformação na cultura institucional. Reconstruir a confiança na governança universitária significa empoderar as pessoas. Significa garantir que docentes sobrecarregados com horas letivas excessivas, investigadores em situação de instabilidade e estudantes que procuram uma formação com sentido sintam que a sua voz conta. Governança não é controlo, é corresponsabilização. E só com corresponsabilidade poderemos construir uma universidade resiliente, inclusiva e preparada para os próximos 50 anos. Escolhamos o diálogo e a empatia com as pessoas, em vez da distância e da voz de comando, a transparência em vez da opacidade, a coragem em vez da gestão do dia a dia. Vamos co-construir a Universidade de Aveiro do futuro, em conjunto. Não para alguns, mas para todos!

“O que se segue depois do desastre eleitoral?”, opinião de Bruno Vilhena
Opinião

“O que se segue depois do desastre eleitoral?”, opinião de Bruno Vilhena

No passado dia 18 de maio, o Partido Socialista (PS) sofreu um desastre. Com toda a certeza, contados os votos da emigração, será a terceira força política na Assembleia da República durante a próxima legislatura. Tendo em conta estes dados, mantive, durante estes dias, um silêncio propositado. Preferi esperar uns dias até organizar bem os meus pensamentos, ouvir e ler o que se foi escrevendo, ter algum tempo para ter opinião e para poder mudar de opinião. Passada uma semana e já com a certeza das diretas para o final de junho – com as quais eu concordo, porque o partido não pode ficar preso a uma liderança interina e sem a legitimidade da militância – é agora tempo de olhar para a frente. O slogan “O Futuro É Já”, ao dia de hoje, quase que parece premonitório. O futuro do PS tem mesmo de ser já. A profunda reflexão que o partido precisa de fazer depois destes resultados não pode significar um partido “fechado para balanço” durante tempo indeterminado. Tem de ser feita e conjugada com a ação concreta no dia a dia da política nacional. O período até às diretas, e das diretas até ao Congresso Nacional, mesmo com as autárquicas pelo meio, deve ser um período para trabalho e discussão aberta e franca sobre o PS que queremos. Existem certamente muitos motivos que levaram o Partido Socialista a ter o resultado desastroso que teve. Assinalarei aqui apenas dois, que são os que me parecem ter tido mais peso na formulação do sentido de voto dos portugueses. O PS não conseguiu reganhar a confiança dos cidadãos eleitores para voltarem a votar nele. Em primeiro, quando apenas pouco mais de um ano passou desde as últimas legislativas e os portugueses consideraram que o governo em funções da AD ainda não teve tempo suficiente para demonstrar a sua incompetência – apesar dos sinais que já existem: um SNS pior hoje do que há um ano, uma economia a descrescer no primeiro trimestre deste ano, o preço da habitação que não parou de aumentar com políticas e medidas desastrosas apenas do lado da procura – e, talvez mais importante; Em segundo, os portugueses continuam a responsabilizar o Partido Socialista – e não estão completamente errados – pelo estado e dimensão a que chegaram os principais problemas que o país enfrenta, sejam eles o estado do SNS, a crise na habitação, ou o estado da imigração. E, por isso, naturalmente, fizeram o juízo de que não voltariam a eleger quem consideram que também esteve na origem do problema. A verdade é que, após a estabilização da economia e o alcance do rigor orçamental com crescimento económico que o PS conseguiu – e conseguiu provar que a esquerda é capaz disso – nos seus primeiros anos de governação pós-2015, perdeu-se uma oportunidade histórica para reformar o país e, em consequência, o nosso tecido produtivo. Não por falta de soluções ou de bases lançadas, que as foram: na habitação, na saúde, nos transportes; mas por um sentimento – tão nosso, aliás – de que não é preciso ter pressa, que vamos com calma, vamos gerindo. Errámos. Os problemas agravaram-se e as pessoas responsabilizaram-nos e continuaram a fazê-lo. Esse é o tipo de eleitorado que só se recupera com tempo e seriedade, e não em clima de instabilidade. Nesse aspeto, Pedro Nuno Santos não teve sorte. Eleito secretário-geral em circunstâncias muito difíceis, lidou logo com umas eleições antecipadas, seguidas de umas europeias complicadas. Nem um ano depois, umas novas legislativas antecipadas e, tudo isto, em pouco mais de um ano de liderança do partido. Teve o sentido de Estado que devia no momento em que o país vivia, viabilizando um Governo e um Orçamento do Estado com os quais não concordava e chumbando moções de censura a esse Governo com o qual não concordava. Furtou-se sempre, e bem, à tática política e acabou por ser essa rejeição da tática, aliada a um Governo que criou todas as crises que podia para entalar o maior partido da oposição, que ajudou a provocar eleições e não deu ao PS o tempo suficiente para se renovar e se reapresentar como uma alternativa de governo. Nesse aspeto, foi difícil fazer melhor, e teria sido sempre mais fácil dobrar a espinha e dar o dito por não dito, conservando o Governo. Quanto ao futuro da liderança do partido, que já parece mais ou menos resolvido, há pouco mais de um ano subscrevi e propus a candidatura de Pedro Nuno Santos a secretário-geral do PS, fiz campanha por ele, votei nele, fui delegado ao Congresso do PS numa lista adstrita à sua candidatura. Acho que o PS tem de estar mais próximo da social-democracia – forte defensora do Estado Social e do papel do Estado para a resolução das crises que vivemos, e até de uma raiz mais trabalhista e virada para o mundo trabalho – do que de um centrismo iluminado que deixa ao mercado a resolução de tudo e usa a “esquerda” meramente como um token para sinalização de virtude. Sei que, por motivos históricos, até, a base eleitoral do PS sempre foi mais burguesa do que operária, mas primeiro perdemos os burgueses e agora até os operários. Não foi pelas circunstâncias terem mudado que estes meus princípios também mudaram e é isso que continuarei a defender como a melhor resposta para o país. Os tempos que se vão seguir serão sempre terríveis para o PS tendo em conta que hoje lidamos com uma extrema-direita parlamentar perfeitamente estabelecida. Aí, o PS não pode cometer o erro de querer lutar para liderar a oposição. O PS tem de lutar para liderar o país. Para isso, não só tem de ter uma alternativa de governo bem preparada, mas tem de estar no terreno. As alternativas não se constroem fechadas numa sala, os nossos autarcas e candidatos autárquicos, que dentro de meses vão a jogo por todo o país, sabem isso melhor do que ninguém. O PS tem de sentir os problemas dos portugueses e assumi-los como seus e deixar de falar para nichos que se vão encolhendo à medida que o tempo passa. O PS tem de voltar a ter um projeto aspiracional para o país em que os portugueses se revejam e não uma lista de compras e de medidas para nichos. Caso não o façamos, estas eleições já provaram mais uma vez que quem absorve o descontentamento não correspondido não é o PS. Uma última nota sobre o voto jovem. Já há dois atos eleitorais que o PS não conquista mais de 20% dos votos nos eleitores entre os 18 e os 34 anos. Existem vários motivos para isso, como o facto de uma geração de novos votantes ter crescido e ganhado consciência política durante um longo período de governação do Partido Socialista, em que associam com naturalidade os problemas do país a quem o governou durante esse período. Mas a minha pergunta é: esta tendência não é nova, o que tem feito e para que tem servido a Juventude Socialista?

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Dia D no Cais do Paraíso: Investidores falam em exclusivo antes da votação decisiva na Câmara
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Dia D no Cais do Paraíso: Investidores falam em exclusivo antes da votação decisiva na Câmara

Num trabalho de investigação jornalística, a Ria começou por aceder à certidão permanente do registo predial do terreno onde agora se pretende construir um hotel com 12 andares e que foi, em tempos, propriedade da Fábrica Bóia & Irmão. Segundo o documento, foi “numa compra em processo de insolvência”, registada na Conservatória do Registo Predial de Ansião a 21 de março de 2016, que a empresa Raízes Seculares – Compra e Venda de Imóveis, Lda. passou a ser a proprietária do imóvel. Trata-se de uma sociedade por quotas, com sede em Águeda, detida em partes iguais por Dina Maria Nunes Ferreira e Luís Pedro de Almeida, que exercem também funções de gerentes. Cerca de dois anos depois, a 4 de junho de 2018, a Raízes Seculares vendeu o terreno a uma sociedade anónima. O processo, registado na Conservatória do Registo Predial do Entroncamento, identificou a nova proprietária: a Cais do Paraíso, S.A.. A Ria tentou contactar as duas conservatórias para aceder às escrituras que indicariam os valores envolvidos nas transações, mas até ao momento não foi possível obter resposta. Poucos meses depois, a 31 de janeiro de 2019, o presidente da Câmara de Aveiro, José Ribau Esteves, numa conferência sobre turismo realizada na Universidade de Aveiro, anunciava publicamente a vinda de um hotel de cinco estrelas com centro de congressos para o Cais do Paraíso, conforme noticiado na altura pelo Notícias de Aveiro. O autarca deixava mesmo um aviso: “Quando eu disser onde vai ser, quantos pisos tem, etc., vai cair o Carmo e a Trindade a algumas almas.” E não estava enganado. A polémica começou de imediato, já que à data não era possível, com a legislação em vigor, construir um hotel de 12 andares naquela zona. O Plano Diretor Municipal (PDM) - revisto em 2019 - limitava a capacidade construtiva a 7 pisos. Para o presidente da autarquia pré-anunciar um projeto daquela dimensão teria de estar certo de que seria aprovado um instrumento legal que permitisse aumentar a volumetria. É nesse contexto que surge o Plano de Pormenor do Cais do Paraíso. O Plano de Pormenor é um documento legal que detalha a ocupação de um terreno: indica onde podem ser construídos edifícios, quantos andares podem ter e que áreas ficam destinadas a jardins, estacionamentos ou serviços. Sem este plano aprovado, não é possível avançar com projetos urbanísticos de grande escala, como hotéis ou centros comerciais. A polémica adensou-se em abril de 2022, quando a agência imobiliária Remax publicou um anúncio a colocar à venda os terrenos da antiga fábrica Bóia & Irmão - já propriedade da Cais do Paraíso, S.A. - por 20 milhões de euros, com direito a imagens 3D de um hotel de 12 pisos. O caso chegou ao debate político, com Ribau Esteves a afirmar, em declarações ao Diário de Aveiro, que considerava o anúncio “estranho” e que tinha pedido explicações aos investidores. Duas perguntas ficaram então no ar: como era possível anunciar um terreno por aquele valor com um hotel de 12 andares se ainda não existia plano aprovado para o efeito? E significaria o anúncio o abandono do projeto? A Remax retirou o anúncio pouco depois, mas o tema voltou em força em agosto de 2023, quando a CMA deliberou “dar início ao procedimento de elaboração do Plano de Pormenor do Cais do Paraíso, com prazo de 18 meses para a sua elaboração”. Poucos meses mais tarde, a 18 de outubro de 2023, a Assembleia Municipal de Aveiro aprovava “medidas preventivas por elaboração do Plano de Pormenor do Cais do Paraíso”, com parecer favorável da CCDR Centro. Essas medidas proibiam operações de loteamento e obras de urbanização, construção, ampliação, alteração e reconstrução (salvo as isentas de controlo administrativo prévio), remodelação de terrenos, demolição de edificações (exceto as dispensadas de controlo) e derrube de árvores em maciço. Ou seja, medidas preventivas são regras temporárias que “congelam” alterações numa zona da cidade enquanto se prepara um novo plano urbanístico. E assim chegamos a julho de 2025, quando o Plano de Pormenor foi finalmente apresentado em reunião camarária, abrindo-se o período de discussão pública e confirmando-se que seria permitida a construção de um hotel com 12 andares. Em plena pré-campanha eleitoral, o tema voltou a incendiar o debate político e as redes sociais. A Ria prosseguiu o seu trabalho de investigação e, através da certidão permanente do registo comercial, confirmou os nomes dos administradores da Cais do Paraíso, S.A.: Munir Asharaf Aly (presidente, residente em Luanda), Nizarali Kassam Manjy (administrador, residente no Dubai) e Sheila Munir Asharaf Aly (administradora, residente em Lisboa). A informação que já circulava na cidade era assim confirmada: a família Munir está ligada ao universo do Grupo VIP Hotels. Foi através da marca Mully Group - que chegou a ser referida no anúncio da Remax e em publicações nas redes sociais - que a Ria conseguiu chegar a Nuno Pereira, responsável de desenvolvimento de projetos imobiliários do grupo, que confirmou estar a trabalhar diretamente no projeto do Cais do Paraíso. Em entrevista exclusiva, o representante começou por esclarecer: “Não tem nada a ver com o Grupo VIP Hotels. Não há aqui nenhuma operação esquisita. Isto é um investimento pessoal e familiar, não tem nada a ver com o Grupo VIP Hotels.” Acrescentou ainda que o projeto avançará sob uma nova insígnia, “Hotel Mully Grand”, desvinculando-se da marca VIP Hotels, apesar das ligações históricas dos investidores àquela cadeia. Nuno Pereira detalhou a estrutura acionista da sociedade: AAK Holding, Limited com 48% (ligada a Munir Asharaf Aly, que também detém 1% em nome individual, tal como a esposa) e 50% pertencentes a Nizarali Kassam Manjy, descrito como “um amigo de infância de Munir”. O investimento global é estimado em cerca de 70 milhões de euros, incluindo hotel, apartamentos turísticos e arranjos exteriores, e deverá criar cerca de 300 postos de trabalho. O representante recordou ainda que as negociações com a autarquia não foram fáceis: a ideia inicial era construir um hotel com cerca de 15 andares, mas a proposta foi rejeitada pela Câmara, tendo o projeto sido redimensionado para os atuais 12 andares. Questionado sobre a polémica do anúncio da Remax de 2022, Nuno Pereira garantiu que a venda “não foi autorizada”. Explicou, contudo, que a agência tinha atuado como mediadora na compra do terreno pela Cais do Paraíso, S.A. e que, quando o anúncio surgiu online, apresentou mesmo um investidor internacional interessado em participar no projeto ou em adquirir o terreno. Ainda assim, permanece a dúvida: tal como circulou nas redes sociais à época e foi referido no comunicado da família Bóia, o anúncio da Remax incluía já uma imagem 3D do futuro hotel, precisamente com 12 andares, o que sugere que apenas alguém próximo da Cais do Paraíso, S.A. poderia ter disponibilizado esse material. Apesar de toda a polémica, a decisão política acontece esta tarde, a partir das 16h30, quando o Executivo camarário votar a aprovação final do Plano de Pormenor do Cais do Paraíso. Caso avance, ficará aberto o caminho para a construção do hotel de 12 andares que divide a cidade entre os que veem no projeto uma oportunidade de investimento e modernização e os que temem a sua dimensão e impacto urbanístico.

Atividade turística da Mealhada cresceu cerca de 17% em 2024
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Atividade turística da Mealhada cresceu cerca de 17% em 2024

“No ano de 2024 registámos um crescimento da atividade turística na ordem dos 17%. Em 2025, já estamos com um crescimento na ordem dos 25%, até ao momento”, afirmou. À margem da conferência de imprensa de apresentação da programação do Cineteatro Messias, para o último quadrimestre de 2025, a autarca esclareceu que também o número de dormidas no concelho tem vindo a crescer. “Em termos de dormidas, só aqui na Mealhada, o crescimento foi de 21,3% em 2024 face a 2023. O concelho da Mealhada registou 110.766 dormidas em 2024”, sustentou. De acordo com Filomena Pinheiro, de janeiro a maio deste ano, o concelho da Mealhada registou aproximadamente 43 mil dormidas. No que toca aos gastos na restauração, a autarca disse ter apenas dados referentes à região Mondego Bussaco, que abrange, para além da Mealhada, os concelhos de Penacova e Mortágua. “De agosto de 2024 a maio de 2025, os gastos na restauração ultrapassaram os 26 milhões de euros na região Mondego Bussaco”, referiu.

Autárquicas: Livre Aveiro apresenta esta sexta-feira a sua candidatura em Oliveira de Azeméis
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Autárquicas: Livre Aveiro apresenta esta sexta-feira a sua candidatura em Oliveira de Azeméis

De acordo com uma nota de imprensa enviada às redações, o momento contará com a intervenções de Ricardo Praça da Costa, cabeça de lista pelo Livre à Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis e à Assembleia Municipal, bem como com a presença de Juliana de Almeida Nunes, número dois na Assembleia Municipal, e Filipe Honório, cabeça de lista à Câmara de Santa Maria da Feira e dirigente nacional do Livre. Na nota, o partido refere ainda que este é um “momento histórico, visto que é a primeira vez que o partido da papoila vai a eleições neste município”. Nas eleições autárquicas de 2021, o PS venceu esta autarquia com “54.87%” dos votos.

PS-Aveiro apresenta candidato à Junta de São Jacinto este sábado
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PS-Aveiro apresenta candidato à Junta de São Jacinto este sábado

A iniciativa integra o ciclo de apresentações que o PS-Aveiro tem vindo a promover com os seus candidatos às freguesias do concelho. Recorde-se que, dos dez nomes já anunciados, apenas João Morgado, antigo presidente da Junta de Eixo e Eirol, e José Eduardo Ferreira Leite não constituíram surpresa. Na altura, em entrevista à Ria, Paula Urbano Antunes, presidente da concelhia do PS-Aveiro, justificou a escolha do candidato em São Jacinto pelo seu trabalho enquanto “primeiro eleito na oposição junto da população, na Assembleia da Freguesia, apresentando propostas, criticando aquilo que é para criticar. Apresenta sugestões sempre de uma forma muito construtiva e com conhecimentos sólidos que tem sobretudo na área do direito”, afirmou. Relembre-se também que a coligação ‘Aliança com Aveiro’ (PSD/CDS-PP/PPM) já avançou, no passado mês de julho, com a apresentação pública da candidata a esta junta de freguesia: Cristina Gonçalves. Na ocasião, a cabeça de lista, Arlindo Tavares, atual presidente da junta, e Luís Souto de Miranda, cabeça de lista à Câmara, responsabilizaram o PS por salários em atraso, penhoras, dívidas superiores a 700 mil euros e pelo que definiram como um verdadeiro “pesadelo” herdado em 2022. O PS iniciou na passada sexta-feira, 22 de agosto, com o ciclo de apresentações dos candidatos às juntas de freguesia, na União de Freguesias de Eixo e Eirol, com a lista liderada por João Morgado. Nesta freguesia, o PS optou por fazer um conjunto de apresentações em vários locais.A primeira sessão decorreu no lugar de Azurva e a seguinte em Eixo. No dia 6 de setembro, pelas 18h00, no Centro Social, segue-se Horta; no dia 27 de setembro, pelas 18h00, no Largo da Capela, Carcavelos e no dia 4 de outubro, pelas 18h00, no Polivalente, Eirol. Ainda no âmbito das apresentações, a Ria sabe que, na União de Freguesias de Glória e Vera Cruz, a sessão terá lugar no dia 13 de setembro, à tarde. Neste caso, o candidato pelo PS-Aveiro será Bruno Ferreira, atual tesoureiro da Junta. *Notícia atualizada às 14h33